terça-feira, dezembro 23, 2008

Derivas de Fevereiro - Ciclo «Escola: Há Lugar para Novos Criadores?». 27/28 de Fevereiro, Biblioteca Almeida Garrett, Porto


Arte Cavernícola com Mínima Imagem
Desde há muito, senão desde sempre, a Escola resiste às novas expressões artísticas, venerando e valorizando um cânone, enquanto que, paradoxalmente, remete os clássicos para o ostracismo. Da modernidade, a escola filtra apenas o que lhe interessa criando unicamente o homo-automatus capaz, com dificuldade, de escrever um contrato, um requerimento ou um verbete. Os media cumprem o seu papel normalizador e reduzem a Escola a um mapa de fait-divers. A poesia, as expressões plásticas, a música, o teatro tornaram-se corpos estranhos à Escola. Coisas meramente decorativas e ao serviço de actividades de circunstância. Falta-lhe, à escola, fôlego e coerência, irreverência e criatividade. Contra o carácter redutor dos programas, propõe-se, agora mais que nunca, uma acção que vise a criação e uma deriva de liberdade que tenha em conta as capacidades e interesses humanos na Escola.
Cidadãos autómatos ou autónomos? A literatura deve ou não fazer-se na escola? E o seu panóptico é a urgência de um hospital de loucos? As bibliotecas escolares são um depósito de livros, professores e outros computadores? Os media como instância de socialização a par da Escola ou contra a Escola? Quem nos salva quanto tudo arde?
Há lugar para os novos criadores?

Sexta-feira, 27 de Fevereiro

9:45 – Entrega de documentação
10:00 – Abertura
10:30 – José António Gomes - Os Clássicos não são coisa do passado
11:00 – Paula CruzO desalinho na poesia que se dá a ler: o lugar dos poetas do séc. XX/XXI na escola
11:30 – Isabel SousaBibliotecas Públicas e a Língua Portuguesa - Para quê?
12:00 - Debate
12:30 – Almoço
14:30 – António Tavares LopesFormas e formatações da expressão individual na Web
15:30 – Suzana RalhaMúsica, Poesia e Escola
16:00 – Emílio RemelheEntre o Modelo e o Novelo. A Escola como palimpsesto
Debate

Sábado, 28 de Fevereiro

10:30 – Rui Pereira(N)a Escola face aos Media
11:00 – Pedro EirasPara que serve a Literatura?
11:30 – Américo Lindeza DiogoConfiguração Arte-Escola-Humanismo. Relações entre Literacia e Arte. Usos da Literatura. Artes e Media.
11:30 – Debate
12:00 – Encerramento
12:30 – Distribuição dos Certificados de Presença

Inscrições e informações para deriva@derivaeditores.pt

!8 de Dezembro, conversa sobre edição na Velha-a-Branca, Braga

A Velha-a-Branca é uma cooperativa cultural, fundada em Braga em 2004. O edifício, no centro da cidade, é agradável e o bar onde se deu a conversa sobre edição de livros extremamente convidativo. A conversa que mantive com António Levy Ferreira sobre livros prolongou-se pela noite. Vale a pena saber deste projecto aqui.

domingo, dezembro 14, 2008

Declaração do Grupo Surrealista de Atenas

Tirado, este artigo, de Pimenta Negra. Sei que o Viriato não se importará, porque a poesia também tem direito à rua. E os surrealistas, esses, mais do que ninguém.

Declaração do Grupo surrealista de Atenas

O ESPECTRO DA LIBERDADE SURGE SEMPRE COM UMA FACA NOS DENTES

O nec plus ultra da opressão social está a ser atingido a sangue frio.Todas as pedras arrancadas do pavimento e atiradas contra os escudos da políicia ou contra as fachadas dos templos comerciais, todas as garrafas flamejantes que traçam suas órbitas no céu nocturno, todas as barricadas erguidas nas ruas das cidades, separando a nossa área da deles, todos os caixotes do lixo do consumo que, graças ao fogo da revolta, tornaram-se Algo saindo do Nada, todos os punhos erguidos sob a Lua, são as armas dando carne, assim como a força verdadeira, não só à resistência como também à liberdade.

E é precisamente o sentimento da liberdade que, nesses momentos, é a única coisa em que vale a pena apostar: aquele sentimento das manhãs esquecidas da infância, quando tudo pode acontecer, porque fomos nós, como seres humanos criativos, que despertámos, e não aquelas futuras máquinas humanas produtivas conhecidas como “sujeito obediente”, “estudante”, “trabalhador alienado”, “proprietário”, “mulher ou homem de família”.

O sentimento de enfrentar os inimigos da liberdade – de não mais os temer.É portanto com boas razões que estão preocupados, aqueles que desejam continuar com a sua azáfama como se nada estivesse a acontecer, como se nada tivesse acontecido.

O espectro da liberdade surge sempre com a faca nos dentes, com a vontade violenta de quebrar as cadeias, todas aquelas cadeias que tornam a vida uma miserável repetição, servindo para reproduzir as relações sociais reinantes.

No entanto desde Sábado, 6 de Dezembro, as cidades do país não estão a funcionar correctamente: nenhuma terapia de compras, nenhuma abertura de estradas para nos levar para o trabalho, nenhumas notícias sobre as próximas iniciativas governamentais de recuperação da economia, nenhuma mudança tranquila de uma telenovela para outra, nenhuma condução nocturna à volta da Praça Syntagma, etc, etc, etc.

Estes dias e estas noites não pertencem aos mercadores, comentadores de TV, ministros e bófia: Estes dias e estas noites pertencem ao Alexis!

Como surrealistas estamos nas ruas desde o início, juntamente com milhares de outros, em revolta e solidariedade; pois o surrealismo nasceu com o hálito da rua, e não tenciona abandoná-la jamais.

Após a resistência massiva ante os assassinos do estado, o hálito da rua tornou-se ainda mais cálido, mais hospitaleiro e criativo que antes. Não é da nossa competência propor uma linha geral ao movimento. No entanto assumimos a nossa responsabilidade na luta comum, já que é uma luta pela liberdade.

Sem ter que concordar com todos os aspectos deste fenómeno de massas, sem sermos partidários do ódio cego e da violência pela violência, aceitamos que este fenómeno existe por um bom motivo.Não deixemos este hálito flamejante de poesia atenuar-se ou extinguir-se.

Tornemo-lo numa utopia concreta: transformar o mundo e mudar a vida!

Nenhuma paz com a polícia e seus mandantes!

Todos para as ruas!Aqueles que não sentem a raiva que se calem!

Grupo Surrealista de Atenas, Dezembro de 2008

Long List do Prémio das Correntes d' Escritas divulgada: 7 poetas editados pela Deriva presentes


Editamos a notícia do Rascunho.net que pode ser concultada aqui.

Presentes a concurso estão, pela Deriva, as/os poetas:

Catarina Nunes de Almeida - A Metamorfose das Plantas dos Pés
Filipa Leal - O Problema de Ser Norte
João Pedro Mésseder - Meridionais
Joaquim Castro Caldas - Mágoa das Pedras
José Ricardo Nunes - Apócrifo
Maria Sofia Magalhães - Da Sombra que Somos
Marilar Aleixandre - Catálogo de Venenos


«São noventa os livros incluídos no primeiro lote de obras seleccionadas para o principal galardão do Correntes d'Escritas. A dois meses da abertura da décima edição, o encontro de escritores de expressão ibérica já mexe a sério.

Já é conhecida a long list para o Prémio Literário Casino da Póvoa da décima edição do Correntes d’Escritas. Será deste conjunto de 90 os livros de poesia que sairá o vencedor do principal galardão do encontro de escritores de expressão ibérica, que decorre na Póvoa de Varzim de 11 a 14 de Fevereiro.

As Quasi são a editora mais representada neste lote, com vinte livros, seguindo-se a Assírio & Alvim e a Caminho, com 10 cada. O resto das contas faz-se assim: com um livro cada, estão Asa, Bonecos Rebeldes, Edições Nelson de Matos, Graal, Intensidez, Pássaro de Fogo e 7 dias 6 noites; com dois, Campo das Letras, Letras e Coisas, Livrododia e Papiro Editora; com três, Oceanos; com quatro, Cosmorama, Cotovia e Pé de Página; com seis, Dom Quixote; com sete, Deriva. As sete obras que sobejam são edições de autor.

O prémio vale 20 mil euros. No júri estão Ana Luísa Amaral – distinguida com o prémio em 2007 –, Casimiro de Brito, Jorge Sousa Braga, Fernando Guimarães e Patrícia Reis, que vão ainda anunciar uma lista de finalistas em Janeiro. O vencedor é conhecido, como habitualmente, na sessão de abertura do encontro, sendo entregue na cerimónia de encerramento. Ruy Duarte de Carvalho foi o vencedor em 2008.

Se nestes 90 encontramos muitos poetas consagrados (e alguns mais do que uma vez), como é o caso de Manuel Alegre, Nuno Júdice ou Armando Silva Carvalho, encontramos nomes frescos em Luís Filipe Cristóvão, Filipa Leal ou João Negreiros. Mágoa das Pedras (Deriva), do recentemente desaparecido Joaquim Castro Caldas também faz parte da selecção.

Miúdos poetas

Passando dos graúdos para os miúdos, também Prémio Literário Correntes d’Escritas/ Papelaria Locus tem a sua própria long list, compreendendo um total de 183 «trabalhos em poesia». Este galardão, que vale mil euros, é destinado a adolescentes com idades entre os 15 e os 18 anos. Podendo participar com um máximo de dois trabalhos, contabilizam-se 133 jovens autores nesta selecção.

O Prémio Infantil Conto Ilustrado Correntes d’Escritas/ Porto Editora, que é uma novidade no programa de 2009 e é dirigido às escolas e aos alunos do quarto ano do ensino básico, viu, «atendendo o pedido de várias escolas», o prazo de entrega de trabalhos alargado até 15 de Janeiro.

As listas das obras que permanecem a concurso podem ser consultadas no sítio da autarquia poveira

terça-feira, dezembro 09, 2008

Arrastar Tinta de Pedro Eiras e Nuno Barros, hoje (quarta), na Fnac de Sta. Catarina, 18:00. Com Helena Lopes

É já hoje, quarta, pelas 18:00, na Fnac de Sta. Catarina, que se apresentará um livro a quatro mãos. Na pintura, Nuno Barros, na escrita, Pedro Eiras. A apresentação será de Helena Lopes e que seja mais um momento para rever amigos, para falar de poesia, das escritas e das palavras, dos desenhos, das cores e das pinturas. Vão até lá e sintam-se como em casa, perticipando sempre.

TEatroensaio estreia O Dia que ficou sempre de Noite, no Cace Cultural do Porto. Para crianças

TEatroensaio

Continua em cena o espectáculo "O Dia que ficou sempre de Noite", até 19 de Dezembro, no Cace Cultural do porto (Rua do Freixo 1071). Este espectáculo destina-se especialmente a crianças.
As apresentações para escolas EB1 decorrem de segunda a sexta às 10h30 e 15h e para o público em geral sábados e domingos às 16h30 (sempre com reserva). TEL: 9186263345 teatroensaio@gmail.com

"O Dia que ficou sempre de noite" é uma peça que aborda a temática da Ecologia e Sustentabilidade, onde se aprende a responsabilidade do ser humano para com o ambiente e a força do seu pensamento. Um espectáculo pensado especialmente para as crianças do primeiro ciclo e com conteúdos que podem ser aplicados ao projecto educativo anual das escolas. Um espaço livre para dar asas à magia do teatro e à imaginação das crianças. Uma história contada por actores e marionetas para aprender a importância da água, da luz,das árvores e da vida em geral.

segunda-feira, dezembro 08, 2008

Volumen, de Henrique Fialho

Tenho-me deparado com um impulso que não me é habitual, visto que não sou um indefectível da «vida» da blogosfera. Interesso-me por ela, mas não sou um militante muito assíduo, nem me interessa sê-lo, sinceramente. Mas Henrique Fialho que criou Insónia e, mais tarde, Volumen, obriga-me a consultá-lo quase todos os dias. Agrada-me o rigor crítico e capacidade de análise que Henrique Fialho empresta aos seus textos e não tem sido em vão que o tenho consultado para saber mais pormenores sobre este ou aquele autor antologiado por ele, em Volumen. Agrada-me sobremaneira o facto que se sente, a léguas, e por quem o lê, de ser genuíno. Gosta do que faz e isso percebe-se a cada linha de escrita.
Desta última vez (embora não tenha sido por isso que escrevo estas linhas), escreveu sobre Os Silêncios entre Nós, de Paulo Kellerman e A Metamorfose das Plantas dos Pés, de Catarina Nunes de Almeida. Vamos ser objectivos: tomara muita gente da chamada imprensa escrita ter a acuidade, o rigor e a honestidade crítica de Henrique Fialho.
É por isto, e por muitas outras coisas, que, para um editor, vale a pena, cada vez mais, enviar os livros à Crítica. A esta crítica.

Festa da Poesia, em Matosinhos


A Festa da Poesia está a ter lugar em Matosinhos desde o dia 6 de Dezembro, na Biblioteca Florbela Espanca. Hoje, segunda-feira às 17h, estará presente Marilar Aleixandre poetisa da Galiza. A Deriva publicou o seu «Catálogo de Venenos» em edição bilingue.
Ficarei lá para a noite, pelas 22h, onde começa uma mesa-redonda imperdível sobre o tema «Poesia». Reparem nos nomes: Alberto Pimenta, A.M. Pires Cabral, Helga Moreira, Isabel de Sá e José Emílio Nelson. Vale a pena a deslocação até lá. Parabéns ao Pedro Eiras que a organizou.

terça-feira, dezembro 02, 2008

sábado, novembro 29, 2008

Arrastar Tinta, de Pedro Eiras e Nuno Barros. Apresentação com Helena Lopes, na Fnac Sta. Catarina, dia 10/12, às 18:00

Já se encontra no prelo esta experiência de Nuno Barros, que pintou, e Pedro Eiras que escreveu. Dessa experiência, nasceu Arrastar Tinta que agora publicamos e que será apresentado na FNAC de Sta. Catarina, no dia 10 de Dezembro, pelas 18:00 (mais minuto, menos minuto). Quem o apresenta é Helena Lopes.

sexta-feira, novembro 28, 2008

Maria de Lurdes Rodrigues e Largo Caballero, a mesma luta



Tive hoje uma certeza: a Largo Caballero já não lhe pesará muito o anátema de ser o primeiro e único anarquista a pertencer a um governo. Naquele caso o governo da Frente Popular espanhola de 1936 e não importa que fosse ou não democrático, se eleito, se nomeado, com autorização da CNT-FAI ou sem ela, que não será isso que virá hoje ao caso. Para a história ficou a de um governo legítimo que perdeu com Franco, o golpista. Hoje, Caballero dividirá este anátema com Maria de Lurdes Rodrigues, que em entrevista ao P2 do Público de hoje (28/11) diz sentir-se ainda anarquista ( nos valores e nos princípios). Relembra, com alguma nostalgia, os sábados e domingos que passava a colar selos nas cartas da Revista Ideia e a embrulhar o jornal A Batalha. Tardes onde não seria preciso pensar muito e onde se repetiam os gestos mecânicos. Vale a pena ler este artigo. Nunca me seduziu a personagem, mas é incrível como não consegue fazer valer uma só ideia sobre educação que a tivesse norteado nesta deriva autoritária contra tudo e todos. Percebe-se o afã quando deixa escorregar uma frase assassina sobre as reformas: que se diz que não se podem fazer contra os seus profissionais, mas, diz ela, a história ensina-lhe que pode fazer sem eles. Assim se compreende a ministra anarquista, muito pouco dada ao pensamento socrático ou, parece-me, a qualquer outro... ah, aquelas tardes de sábado e domingo a colar selos e a empacotar jornais! E, hoje, também me apetece ser monárquico - Viva, pois, o Rei Ubu!

Os Três Desejos de Octávio C, romance de Pedro Eiras apresentado hoje

Na Biblioteca Florbela Espanca, em Matosinhos, hoje dia 28 de Novembro, pelas 21:30, vai falar-se com Luís Mourão e com o autor sobre Os Três Desejos de Octávio C, editado pela Relógio d' Água. Não valerá muito a pena dizê-lo, porque isto da boa leitura terá as suas subjectividades, mas que se lê agradavelmente de um fôlego, lá isso lê-se... se isso não é prazer da leitura, então não sei o que isso será.

quarta-feira, novembro 19, 2008

Do Livro à Cena - as Actas dos XIII Encontros Luso-Galaico-Franceses publicados pela Deriva, Já disponíveis

DO LIVRO À CENA de Isabel Mociño González, Marta Neira Rodríguez, Ana Margarida Ramos e Sara Reis da Silva

Neste volume reúnem-se os trabalhos apresentados nos XIII Encontros Luso-Galaico-Franceses do Livro Infantil e Juvenil, realizados na Biblioteca Municipal de Almeida Garrett, no Porto, entre os dias 15 e 17 de Novembro de 2007. Sob o tema Do Livro à Cena, vários especialistas, oriundos de diferentes realidades culturais e linguísticas, reflectiram sobre o texto dramático para a infância e juventude, dando, igualmente relevo à sua concretização em espectáculo teatral. A publicação em livro das ideias
partilhadas durante os dias dos Encontros surge como uma forma de estimular o interesse pelo teatro para a infância, mantendo viva a reflexão sobre uma prática que merece atenção dos investigadores e do público em geral.

Uma Boca muito Aberta, de Luís Maffei, sobre A Metamorfose das Plantas dos Pés de Catarina Nunes de Almeida. artigo editado na revista A Pequena Morte



Luis Maffei é poeta e professor de Literatura Portuguesa da Universidade Federal Fluminense e screveu este arigo na revista A Pequena Morte.

(recensão a A metamorfose das plantas dos pés, de Catarina Nunes de Almeida. Porto: Deriva, 2008):
A metamorfose das plantas dos pés exige a quem sobre ele escreve estar “dentro dentro dentro” [1], assim, muitas vezes por intensidade, como leio na tradução/ mudança de Herberto Helder a “Sobre tradução de poesia”, poema do polonês Zbigniew Herbert. Portanto, deixa de ser uma escrita sobre para ser uma escrita em, e o livro é provocativo desde o estranho poema-dedicatória que o abre: “Ao Vesúvio/ que me engoliu” (p. 6). O vulcão é um lugar de estar, e vejo-me, pois, diante da necessidade de também ser metido nele, engolido, exposto a sua boca muito aberta, ainda mais se leio, já pelo fim do livro, que “A neve no cume do vulcão concede ao fogo/ o rosto das amendoeiras” (p. 46). Existe uma iniciação a ser cumprida, pelo mundo, no mundo.
Cria-se, imediatamente, uma estória, uma trilha, um caminho, uma epígrafe de parceria: “Guarda-te melhor/ guarda-te caminhante/ do caminho que também caminha” (p. 7), Rilke. Se assim, abro da mesma forma a minha boca, abro os olhos à minha própria estória, faço minha a escrita dessa obra que, como uma senda, possui capítulos: o I tem título idêntico ao do livro; o II se chama “Corpo floresta” e o III, “A descoberta do fogo”. Desconfio que exista uma tarefa para o leitor: a de tornar-se capaz de III porque terá sido capaz de II, e o ato metamórfico da transformação do “corpo” em outro terá que respeitar o mesmo: agregação, não substituição. E “fogo” nas mãos, enfim, “fogo” na “floresta”, incêndio, amor ainda é um fogo, a “neve” vive no “vulcão”, caldeia-se, queima as plantas dos pés.
“Reconheces esta água para onde cais?” (p. 11), primeiro verso do primeiro poema de “A metamorfose das plantas dos pés”: amor ainda é um fogo, amor ainda é capaz de um “rendilhado de luas maternas”, de “todas as conchas”, de “todas as coxas celebradas” (p. 11). Caminhar com Catarina é caminhar de mãos dadas, pois a boca que fala convida a um dueto que se manifesta no assombroso, por complexo, erotismo dos poemas. “O álbum abriu a boca enorme”, numa modificação extrema do mundo, “e repara no perfume dos ossos/ como se as fotos continuassem lá longe/ debaixo da terra (…)” (p. 12): algum luto nessa memória um tanto familiar. Mas “coxas” são lugar de passagem e paisagem, “as unhas que outros cravaram pelas coxas” (p. 47), “e as vozes recolhiam-se sempre mais até serem/ um fio de prado um horto de lutos cristalizados: da marcha líquida dos soldados/ bebem as aves e as aveleiras” (p. 48).
É flagrante a fusão entre corpo e paisagem, corpo e mundo, lugares de tangência e encontro, encontros, fusão. Insisto na boca do canto, muito aberta: “Avistei a boca ao entardecer” (p. 14), e insisto na fusão: “Plantei o primeiro seio/ a que chamámos macieira/ e abandonei o ventre/ à generosidade vegetal./ Nessa noite dormimos por dentro e por fora/ do mundo.” (p. 14). Sim, exposta está uma relação, uma mistura: maternidade, eu, outro, nós, corpo, mundo. A natureza, aqui, é lugar de “generosidade”, mas a natureza reside nos corpos que, generosamente, fazem do mundo uma convidativa cama.
Se o corpo é natural, capaz de ser “Corpo floresta”, ele não deixa de ser da cultura, e culturaliza, de modo agudamente pessoal, a sorte de “Vesúvio/ que” o “engoliu”: “Tantas vezes se falou de origens vulcânicas/ e no entanto era nosso destino adiar o fogo/ compor hinos às árvores decepadas” (p. 15). Um gesto de feminização do mundo, ainda mais notável no último poema do livro: “Os homens desaguaram dentro dos homens/ bailarinas alinhadas para o primeiro acto de amor./ Só o amor cheira a sangue só as cigarras/ o perfume das espadas na ossatura dos campos/ completam a primavera na vala comum.” (p. 48). Homens “desaguaram” noutros “bailarinas”, e delas imitaram o gesto e o viço. E “na vala comum” a “primavera”, uma tensão entre certa ecologia política e certa ecografia, cultura a naturalizar o discurso da boca muito aberta de Catarina Nunes de Almeida, que compõe “hinos”, faz poemas.
E uma terceira pessoa é romanceada nesse livro de poemas, metamórfico como as tranformantes “plantas dos pés” que passeiam por seu título: “Deixou-se ficar ao sol – a língua iluminada/ polida pelo vento e as ruínas da folha onde foram/ um joelho um braço rasgando as nuvens.” (p. 26): é na escrita que se dá o erotismo nesses poemas, o que me faz pensar imediatamente em Luiza Neto Jorge, amante da “folha” como lugar de texto e corpo, dona de “língua iluminada” para atos eróticos em cantos e recantos. Claro, é possível detectar muita poesia portuguesa (e não só: atenção ao Rilke da epígrafe) em A metamorfose das plantas dos pés; Fiama, por exemplo, na lida com o que seja natural, na concisão e na “Ave severa esta árvore que embala a morte.” (p. 26): se “Água” ainda “significa ave” [2], vejo-me diante não apenas dum modo de reinventar a metáfora, mas dum tipo de significação a que interessa o encontro do diverso. Pela diferença, a tangência, e, na tangência, ainda uma grande novidade.
Novidade no corpo, do corpo, “Corpo floresta” capaz d’ “A descoberta do fogo”, da prática de um amor aprendiz que tem no poema seu lugar de iniciação: “Vieste para a floresta carregado de dedos/ como quem vem abraçar por dentro/ uma árvore o bicho que cai/ entre sílabas e âncoras minúsculas./ Estás pousado na terra/ mas são as ervas que se deitam no teu dorso constelado/ e aguardam o correr das nuvens/ a respiração de algum astro mais brando.” (p. 38). Deliro nas preposições: “de dedos”, não por dedos; talvez, portanto, como dedos, extremidade, sim, do corpo, tangência, tangência sempre. Se “por dentro/ uma árvore”, entra-se nela e por ela é-se entrado, e os “homens desaguaram dentro dos homens” pois se trata, enfim, do humano. E aqui suspeito (invento? Caso sim, peço desculpas, mas, como vou de mãos dadas a Catarina, é efeito de leitura, é coisa, antes de mais, dela) duma nova metamorfose, espantosa: é estelar e cósmico “algum astro mais brando”, com manifestação direta na “respiração” de homens e mulheres, sobretudo se amantes. Mas, sendo do uso da língua referir-se a grandes nomes com o vocábulo “astro”, e se “brando” é o nome de um grande nome, penso no estadunidense milagre humano que atende pelo nome de Marlon Brando, “astro”, em algum nível, cujo corpo se pode acessar pelo símbolo, pelo drama, pelo fingimento.
Pessoa, pois: num poema celebração do incêndio, celebra-se Nero – “Bendito sejas tu, Nero, entre os pássaros”. Celebra-se também Ricardo Reis, não pelo que foi, mas pelo que poderia ter sido: “desenlacemos as mãos, Lídia,/ lancemos estas mãos ao mar –/ alguém cumprirá por nós/ as promessas.” (p. 39). Serão “promessas” não cumpridas de amor vívido e vivido? Catarina leitora também de Adília Lopes – “casa-te com Lídia/ tem bebés/ passa a lua-de-mel/ na Grécia” [3] –? Talvez eu possa pensar nos “bebés”, nos filhos como cumpridores da fogosa promessa que une o Ricardo Reis de Catarina a essa nova Lídia, pois uma figura forte de A metamorfose das plantas dos pés é a mãe: “e tu tremias quando te chamava/ mãe.” (p. 17). Encerro a citar um poema que se encontra longe do fim da obra, e percebo que o caminho inventado por esse livro com capítulos não é de direção única: como uma boca muito aberta, as trilhas dessas falas têm diversos sentidos, cá e lá, para frente e para trás, sem que jamais alguma paralisia ouse mostrar-se.
NOTAS
[1] HELDER, Herberto. Oulof. Lisboa: Assírio & Alvim, 1997. p, 10.[2] BRANDÃO, Fiama Hasse Pais. Morfismos. In. BRANDÃO, Fiama Hasse Pais et. alli. Poesia 61. Lisboa, Edição de autor, 1961. p. 1.[3] LOPES, Adília. Obra. Lisboa: Mariposa Azul, 2000. p. 387.

Cimeira do G-20 - O capitalismo faz milagres, de Santiago Alba Rico

Santiago Alba Rico é um filósofo espanhol que vive na Tunísia, onde ensina na Universidade. Escreveu o livro colectivo publicado um mês depois do 11 de Março de 2003 em Madrid, "Três dias que enganaram o mundo".


de Rebelión, 16-11-2008

O capitalismo é isto: um homem magro pede pão e recebe dez frangos um homem gordo; uma criança doente pede uma vacina e dobram a ração de vitaminas a uma criança sã; uma mulher com frio fica sem casa e entregam três edifícios mais ao senhorio. Há três dias, a edição digital do «El Mundo» (13.11.2008) publicava o seguinte título; «Solbes admite que as famílias ‘notam pouco’ as ajudas à Banca» [“Solbes admite que las familias `notan poco´ las ayudas a la banca”].
O diabólico deste título —e desta declaração— é que o seu simples enunciado converte a ordem lógica das coisas numa contingência inesperada e incompreensível: Sim, ‘confesso’ que o mar se tornou líquido ou ‘reconheço’ que a neve não é preta, a liquidez e a brancura apresentam-se aos nossos olhos contra todas as previsões, contra o bom senso e —mais ainda— contra as regras.

As palavras de Solbes obrigam-nos a dar por adquiridos precisamente os dois princípios que a sua concessão vinha negar; o primeiro é que o normal, o lógico, o natural seria que as ajudas à banca beneficiassem as famílias, como o normal, o lógico e o natural é que se eu atiro moedas de chocolate sobre Paris, elas caiam no Alaska, ou se rego o meu jardim em Salamanca cresçam rosas no Djibuti; o segundo é que o verdadeiro propósito do governo tenha sido sempre o de ajudar as famílias, como o verdadeiro propósito de um marido infiel, quando acaricia a sua amante é proporcionar um orgasmo à sua mulher, ou o verdadeiro propósito de um prevaricador, quando desculpa o assassino seja o de homenagear a sua vítima.
Em tempos, o Rebelión tinha uma subsecção denominada: «Outro título é possível». A surpresa e a contrariedade de Solbes, perante a inesperada, inexplicável, irregular e anti-natural insensibilidade das famílias, que não notam o orgasmo dos bancos, revelam melhor toda a sua obscenidade à luz de outros títulos que me ocorrem ao correr da pena
“Solbes admite que o que os hóspedes do Hilton comem não alimenta os africanos”
“Solbes admite que o aumento de carros na Europa não ajudou os mecânicos do Haiti”
“Solbes admite que no jacuzzi de Emílio Botín não cabem 4.200 milhões de pessoas”
Ou o fluxo empático negativo:
“Solbes admite que o tsunami da Indonésia não afectou a costa espanhola”
“Solbes admite que os corpos dos nova-iorquinos sentem pouco as torturas em Abu Ghraib”
“Solbes admite que a escassez de água em muitas regiões de África não se fez sentir nas piscinas de Alicante”

Seria um milagre, que o menu da cimeira de Washinton engordasse os 950 milhões de esfomeados de todo o planeta. Que a dor dos iraquianos, dos palestinianos, dos afegãos, dos haitianos, dos congoleses doesse ao mundo inteiro, seria justo e humano. O capitalismo pretendeu fazer magia: que alguns comêssemos, bebêssemos, consumíssemos, nos divertíssemos e todos em toda a parte ficassem contentes. O que conseguiu, pelo contrário foi mais isto: que a maioria passe fome e sede, viva pouco, adoeça e sofra e que nós não sintamos nada.
Mas, vendo melhor, sim, as famílias europeias começam a notar as ajudas aos bancos, como as notam desde há décadas no Terceiro Mundo. Para o prevenir, os 22 países mais poderosos do planeta reuniram-se a comer codorniz fumada e a tomar algumas medidas partilhadas para poderem continuar com a magia e os milagres e para que —se for esse o caso — reprimir os blasfemos incrédulos que, apesar das carnes do Hilton, do «green» bem regado dos campos de golfe e da alegria dos banqueiros insistam em conservar um corpo faminto, sedento e dorido.
Também me ocorre outro título possível, para outro mundo possível: ‘O G-191 reúne-se para coordenar o socialismo do século XXI’. Se a ONU tivesse algum poder, todos os enormes recursos, todos os extraordinários esforços colectivos, todas as instituições internacionais que hoje dedicam o seu tempo e o seu saber a cogitar milagres assassinos não serviriam para impor algum terreno e profano realismo? O que a cimeira do G-20 demonstra é que a coordenação internacional, a cooperação entre Estados, a planificação global são possíveis e funcionam- O que demonstra é que até agora a coordenação internacional, a cooperação entre Estados e a planificação global apenas serviram para inventar complicadíssimos procedimentos destinados a dar de comer ao saciado, robustecer o curado, consolar o ditoso, socorrer o rico, armar o injusto e libertar o homicida. Também, bem entendido, para impedir qualquer resistência contra estes mandamentos.
«O capitalismo não é o culpado», diz Bush. A única coisa que sabemos, porém, é que a culpa não é da União Soviética. Fracassou o socialismo? Nem sequer se tentou.

segunda-feira, novembro 03, 2008

Miguel Carvalho e Rui Pereira na apresentação/debate sobre a Intoxicação Linguística. Sábado, 8 de Nov, 21h. Bar Uptown, Porto

Sábado, dia 8 de Novembro, pelas 21:00, no Bar Uptown (Rua Breiner, 59, na Cedofeita) Miguel Carvalho, Rui Pereira e António Luís Catarino vão debater com quem estiver presente a Intoxicação Linguística de Vicente Romano. Uma boa ocasião para estudar a questão da linguagem política nas diferentes áreas de intervenção do estado e das instituições que lhe estão associadas. Debate informal, como aliás se quer.

domingo, outubro 26, 2008

Com Quatro Pedras na Mão: já no dia 2 de Novembro, uma sessão única com o Bando dos Gambozinos. No Cinema Batalha, 18h

É já no domingo, dia 2 de Novembro, pelas 18h, que o Livro CD, Com Quatro Pedras na Mão - o Porto cantado por Crianças e Jovens, terá a sua apresentação com uma sessão única no Cinema Batalha cantada pelo Bando dos Gambozinos.


As músicas foram compostas por Suzana Ralha sob poemas de Filipa Leal, João Pedro Mésseder, Joaquim Castro Caldas, Jorge Sousa Braga, José Mário Branco, Luís Nogueira, Luísa Ducla Soares, Matilde Rosa Araújo e Rui Pereira.


As ilustrações do livro são de Emílio Remelhe sob orientação gráfica de Gémeo Luís.


Atenção: As entradas serão aceites por convite. As pessoas que estiverem interessadas em assistir ao espectáculo dirigir-se-ão a este blogue, ou ao Bando dos Gambozinos, com indicação do nome e contacto (morada, telemóvel e/ou mail) a fim de serem remetidos, ou guardados, os bilhetes. Atenção que já existem só alguns.

Magma: três novas edições a partir deste mês. Dramaturgias de Pedro Eiras presentes no número 5

A revista magma tem 3 novas edições a partir de 15 de Outubro de 2008: o 5 e o 6, dedicados às novas dramaturgias portuguesas contemporâneas e o 7, um número especial com coordenação brasileira de Lélia Nunes e Luiz Antonio de Assis Brasil, uma ponte literária entre o Brasil e os Açores.

Magma 5, Dezembro de 2007
Dramaturgias portuguesas contemporâneas 1
Coordenação de Carlos Alberto Machado
Carlos Alberto Machado
Divide a sua actividade criativa entre a escrita, a investigação e a prática teatral.
Formação universitária em Antropologia (licenciatura na Universidade Nova de Lisboa) e a sociologia (mestrado em Sociologia da Cultura, Comunicação e Tecnologias de Informação no ISCTE).
Foi professor de disciplinas teatrais na Escola Superior de Teatro e Cinema e na Universidade de Évora.
Publicou: Teatro da Cornucópia. As Regras do Jogo, Cuidar dos Mortos, Mundo de Aventuras, Ventilador, Transportes & Mudanças. Três Peças em um Acto, Os Nomes que Faltam, Mito, seguido de Palavras Gravadas na Calçada, Restos. Interiores, Aquitanta, A Realidade Inclinada, Aventuras Extraordinárias do Príncipe e do Castor (em colaboração) e Talismã, além de diversas obras para a história do teatro em Portugal, a participação em colectâneas e colaboração em jornais e revistas.
É co-director da revista Magma (com Sara Santos) e dos Cadernos SIBIL (com José Augusto Soares). Dirige com Urbano Bettencourt a Biblioteca Açoriana.
GONÇALO M. TAVARES, Possibilidades e ética: que teatro?
ABEL NEVES, Provavelmente uma pessoa
JACINTO LUCAS PIRES, O amor de Adalberto Silva Silva
MÁRIO CABRAL, O jantar

PEDRO EIRAS, Monólogos:
O pirata
Simulacros
O aquário
Silêncio
Travessia
Despojos
Do fim do mundo

Magma 6, Junho de 2008
Dramaturgias portuguesas contemporâneas 2
Coordenação de Carlos Alberto Machado
JAIME ROCHA, Quatro cegos
MARCELA COSTA, A angústia do museólogo (antes da abertura da exposição)
REINALDO MAIA E JORGE LOURAÇO FIGUEIRA, Cabaré da Santa
TIAGO RODRIGUES, A partir de amanhã

Magma 7, Dezembro de 2008
Coordenação de Lélia Pereira da Silva Nunes e Luiz Antonio de Assis Brasil
Lélia Pereira da Silva Nunes (Brasil)
Nasceu em Tubarão, vive em Florianópolis, Ilha de Santa Catarina. Socióloga e escritora. Autora de Caminhos do Divino, um olhar sobre o Espírito Santo em Santa Catarina, além de outros títulos em biografias, crônicas e ensaios sobre a cultura catarinense de aporte açoriano. Participa em antologias nacionais e portuguesas. Colabora em periódicos e jornais açorianos e luso-americanos. Coordenou o projecto literário Caminhos do Mar – antologia poética: Açores – Santa Catarina. Professora Mestre de Sociologia da UFSC, aposentada. Preside a Fundação Cultural Anibal Nunes Pires.
Tem colaboração na Magma (número 4).
Luiz Antonio de Assis Brasil (Brasil)
Nasceu e vive em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. É ficcionista e ensaísta, com 17 livros publicados. Prêmios literários: Jabuti, Açorianos, Machado de Assis e Portugal Telecom de Literatura. Professor-Doutor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Orienta pesquisas sobre a narrativa açoriana Pós-25 deAbril. Website: http://www.laab.com.br/.
Pedidos a: Dpto. de Teoria Literária e Literatura Comparada
DTLLC - FFLCH - USP
Av. Professor Luciano Gualberto, 403
Cidade Universitária - Butantã
Cep: 05508-900 - São Paulo - SP

Rui Bebiano escreve, na Revista Ler nº 73, sobre O Espírito Nómada de Kenneth White

A última Revista Ler, nº 73, debruça-se sobre os 10 anos da morte de José Cardoso Pires. Deve ler-se. Até porque a sua qualidade melhorou a olhos vistos, deva-se ou não à responsabilidade de Francisco José Viegas e à equipa que a compõe.

Rui Bebiano escreve assim, num pequeno extracto que publicamos sobre O Espírito Nómada de Kenneth White, um livro editado este ano pela Deriva:

«White prefere associar a erudição à forma de errância qua alarga a leitura do mundo e, através de «universos de substituição», liberta o humano do «universo concentracionários das civilizações». Neste livro, escrito há duas décadas, enunciam-se alguns dos caminhos que essa escolha poderá abrir. Atravessando múltiplos saberes, o autor procura conduzir o leitor até esse território radical, que chama de geopoética dentro do qual pretende unir a presença no mundo a uma estética que seja poderosa, comevedora e bela. Se o prestígio do «nomadismo intelectual» se afirmou pelo menos desde os românticos, Kenneth White é dos primeiros a conferir-lhe uma base teórica. (...)». Os livros que acompanham esta obra, são Istambul de Orhan Pamuk, Fantasmas de Espanha de Giles Tremlett, Diário da Batalha de Praga. Socialismo e Humanismo de Flausino Torres e O Um Dividiu-se em Dois de Pacheco Pereira.

terça-feira, outubro 14, 2008

Gustavo Rubim escreve na Relâmpago sobre Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas


A revista nº 22 da Relâmpago é, toda ela, dedicada a Eduardo Lourenço, ensaísta a que também dá atenção Pedro Eiras num artigo, nesta mesma revista, titulado de «Portas de Lisboacopenhaga - notas sobre uma página de Eduardo Lourenço».
Mas é no plano da crítica de livros deste número que Gustavo Rubim se debruça sobre Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas, livro que, como estamos recordados, foi coordenado por Pedro Eiras e surgiu como fruto de um Encontro com o mesmo nome que teve lugar na Biblioteca Florbela Espanca ,em Matosinhos, a 11 de Outubro de 2007.
À página 244 da Relâmpago, Gustavo Rubim, sobre este trabalho, diz:
«Para aqueles que andam vaticinando o fim apocalíptico das humanidades (e, em especial, dos estudos literários), este livro não traz boas notícias. O que aqui se lê pode não chegar para anunciar o advento de algum super-Eduardo Lourenço, mas mostra que a prática da leitura crítica, interpretativa, ensaística, dá em Portugal sinais de gozar um período de boa saúde. Claro que, para quem anda vaticinando o fim apocalíptico (do que quer que seja), a saúde é apenas um estado precário que, bem vistas as coisas, não augura nada de bom, como alguém luminosamente explicou - e, nesse sentido, afinal, nem este livro nem qualquer outro alguma vez trarão boas notícias...»
e mais à frente:
«... A boa qualidade geral dessa pesquisa é o primeiro traço a registar, sem qualquer reserva, como mais-valia do livro, aliás extensível às colaborações não associadas à FLUP. Esta avaliação ressalva, evidentemente, que há ensaios menos interessantes (e até desinteressantes), mas nenhuma necessidade de particularizar aqui: afinal, a juventude dos respectivos autores justifica que esperemos com confiança produções mais amadurecidas. (...)»
E continua por mais duas densas páginas que não iremos, evidentemente, repor aqui. Para já, um conselho: vale a pena a sua compra.

E foi assim no Clube Literário do Porto

A 11 de Outubro no Clube Literário do Porto, e com sala cheia, Filipa Leal disse poemas, por ela traduzidos de uma maneira exemplar, de Lawrence Pettener. De Liverpool, este galês irlandês, de copo de gin na mão, disse poemas em inglês e em gaélico. Foi um dos raros momentos de magia que aconteceu por ali, junto ao rio e ao fim da tarde, a ouvir uma língua antiquíssima que nos coloca na verdadeira dimensão do mundo das palavras e das coisas que nos animam. Ali, entre a Foz e a Ribeira do Porto, cheirou-se por um momento à Guiness, ao barulho das gaivotas, ao cheiro a peixe de Dublin e às palavras trocadas nos pubs por homens de barba ruiva e mulheres bonitas. Com velhos barcos de velas brancas ao fundo.

segunda-feira, setembro 22, 2008

Lawrence Pettener, poeta inglês, no Clube Literário do Porto a 11 de Outubro (17h). Com leituras poéticas traduzidas por Filipa Leal



O guindaste branco espalha as suas asas
Poesia de Lawrence Pettener
na presença do poeta inglês

Leitura e tradução portuguesa de Filipa Leal
11 de Outubro, pelas 17h
Clube Literário do Porto

Lawrence Pettener vive em Bristol, mas costuma identificar-se como sendo “Irlandês de Liverpool”. A sua poesia está traduzida em várias línguas europeias e tem feito leituras em cidades como Berlim, Liubliana e Amesterdão. Licenciado em Literatura inglesa e Mestre em Escrita Criativa, tem trabalhado como revisor em publicações periódicas e textos literários. Na primeira visita ao Porto, Lawrence Pettener promete fazer uma leitura dos seus poemas não só em inglês mas também em irlandês gaélico.

Filipa Leal nasceu no Porto. Formada em Jornalismo, é Mestre em Estudos Portugueses e Brasileiros. Publicou «lua-polaroid», «Talvez os Lírios Compreendam», «A Cidade Líquida e Outras Texturas» e «O Problema de Ser Norte». Tem participado em vários Encontros de Poesia, nomeadamente na Galiza, em Pisa, Zagreb e Bristol. Integra, desde 2004, os Seminários de Tradução Colectiva de Poesia Viva da Fundação da Casa de Mateus.



Lawrence Pettener e Filipa Leal no Festival de Poesia de Bristol, 7 de Setembro de 2008

terça-feira, setembro 16, 2008

«9 de 9. Poesia actual portuguesa.» Presença de Catarina Nunes de Almeida e Filipa Leal

Aqui vai a notícia tal como nos chegou:

«La editorial Centro de Estudios Literarios y de Arte de Castilla y León (Celya ) ha editado la publicación '9 de 9. Poesía actual portuguesa', que recopila poemas en portugués y su traducción al español de nueve jóvenes autores de Portugal.
Los autores seleccionados son todos ellos «jóvenes poetas nacidos trasla revolución de los claveles y la caída del régimen dictatorial salazarista en Portugal», según explicó ayer el poeta zamorano JesúsLosada, encargado de coordinar la publicación y traducir los poemas al español.
La obra es el cuaderno número 18 de la colección Aedo de poesía y
su publicación ha sido posible gracias al patrocinio de la Fundación CajaRural de Zamora, que ha sufragado el coste de los dos mil ejemplares editados.
El libro, de 24 paginas, se distribuirá gratuitamente a través de CajaRural, así como en universidades y centros de estudio de Portugal. La publicación recopila nueve poemas de otros tantos autores portugueses, algunos de los cuales, pese a su juventud, ya gozan de reconocimiento en Portugal y han traducido parte de su obra a otros idiomas europeos, según explicó a Efe Jesús Losada.
El primero de los poemas es de José Luis Peixoto, uno de los escritores más importante del panorama literario portugués, que tiene en su haber el premio José Saramago, «el equivalente al premio Planeta español», ha asegurado el autor de la publicación.
El libro incluye también versos de los poetas de Oporto José RuiTeixeira, Rui Lage y Filipa Leal, así como de los lisboetas Pedro Sena Lino, Vasco Gato y Catarina Nunes de Almeida.
La publicación se completa con los poemas de Joao Ricardo Lopes, natural de Fafe; y Jorge Reis-Sá, autor originario de Vila Nova de Famalicao. Losada indicó que esta publicación quiere ser un anticipode una antología más amplia que prepara sobre la literatura y la poesía portuguesa.»
NB: a foto de Jesús Losada neste post é de Luis Calleja

quinta-feira, setembro 11, 2008

A Intoxicação Linguística, próximo livro de Vicente Romano. Em breve nas livrarias

Capa de Gémeo Luís

Depois de A Formação da Mentalidade Submissa, Vicente Romano edita, na Deriva, A Intoxicação Linguística. Estará, muito em breve nas livrarias.

Introdução — Jornalismo e Língua

Pela sua própria natureza, a informação é selectiva. Devido às limitações espácio-temporais, aos condicionamentos profissionais, ideológicos, culturais, etc., os jornalistas vêem-se sempre obrigados a seleccionar. Quase nunca dispõem do tempo, do espaço e da autodeterminação suficientes para dizer o que gostariam. Daí que possa afirmar-se que um domínio superior da língua, o seu uso consciente e competente seja uma das qualidades fundamentais do jornalista. Entre os jornalistas, embora sejam raros, podem existir casos de ingenuidade profissional, mas em informação nada há que seja inócuo.
O uso correcto da língua contribui para a eficácia da comunicação, para o aumento do conhecimento, quer dizer, para que a ignorância se reduza e para a ampliação da liberdade humana. Por isso há que cuidar e dominar a língua, os recursos expressivos para a transmissão de informações.
Em tempos de guerra, de incerteza e de angústia social como os actuais, é fácil recorrer ao sensacionalismo, à manipulação orientada da emocionalidade. Sim, os profissionais da informação não podem renunciar à sua sensibilidade ante a dor e a exploração dos seres humanos. As suas reportagens e as suas palavras reflectem a sua posição perante os factos, mesmo quando tentam ocultá-los. Mas não se pode esquecer que estes profissionais são observadores, não actores. E, ainda que a verdade possua muitas caras e seja difícil obtê-la por inteiro, podem, sim, aproximar-se dela.

II

Porém, como dizia o senador norte-americano Hiram Johnson, em 1917, a verdade é a primeira vítima da guerra. Em termos semelhantes se manifestara no seu, Da Guerra, o general prussiano Carl von Clausewitz, cem anos antes: “Uma grande parte das notícias que recebem na guerra é contraditória, outra parte ainda maior é falsa e a maior parte é bastante duvidosa…”. Em suma, concluí Clausewitz, «a maioria das notícias é falsa e o temor dos seres humanos reforça a mentira, não a verdade».
Como demonstraram a II Guerra Mundial, o desmembramento militar da Jugoslávia, a Guerra do Golfo ou as agressões contra o Afeganistão, o Iraque e o Líbano, as palavras do senador norte-americano no princípio do século XX, como as do general prussiano no início do século XIX não perderam validade. Pelo contrário, reforçaram-se mais e mais.
O controlo da informação e difusão de notícias e imagens foi sempre utilizado como uma arma essencial para submeter vontades e conquistar consciências. Por isso, o Pentágono não deixou ver qualquer imagem da Guerra do Golfo, anunciada como a primeira guerra televisionada na História, nem a administração norte-americana mostrou os corpos das vítimas do 11 de Setembro, como não permite, hoje, a difusão de qualquer notícia ou imagem do Afeganistão ou do Iraque que não esteja controlada, isto é, manipulada pela CIA e pelo Pentágono. E, para maior sarcasmo, isto é feito por um governo que proclama aos quatro ventos a liberdade de expressão como um dos pilares da sua organização social.
O objectivo consiste, naturalmente, em que apenas se conheça uma versão dos factos, ou seja, a comunicação unidireccional e unilateral, irreversível. Mas, por definição, a comunicação engloba o elemento da reciprocidade, da dicção e da contradição, da partilha do conhecimento. Por isso é contraditória com a vontade autoritária, a qual recorre à força e à violência física. Reciprocidade significa franqueza, abertura aos outros. Na comunicação aberta são o conhecimento e o raciocínio que se concretizam. A violência, seja esta física seja psicológica, deforma o pensamento, uma vez que não indaga acerca do verdadeiro e do falso. Os meios que se fecham impedem a comunicação. Não são recursos de violência física, não são bombas, mas transformam os seres humanos em coisas e a política que se transmite por seu intermédio não pode senão estar submetida à coacção que os meios exercem sobre os fins (Pross, 1971).
(...)
In, A Intoxicação Linguística, Vicente Romano. Em breve distribuido nas livrarias

Spike Island's Canteen, Free event

Poetry reading by Filipa Leal and Lawrence Pettener, Sat 06 September, 3:30pm
Join us for an informal afternoon when Leal and Pettener will read as part of the Bristol Poetry Festival 2008.
Filipa Leal was born in Porto, Portugal in 1979. She is a poet, a writer of fiction and a journalist. She is the author of three collections of poetry: Perhaps the Lilies Understand, The Liquid City and Other Textures, and The Problem of Being North. Filipa will be reading her own work which she has translated from Portuguese into English
Lawrence Pettener is a Bristol-based poet. His work has been translated into various European languages, and he has given readings in Berlin, ljubljana and Amsterdam.Free Event: 3.30pm, Saturday 06 SeptemberSpike Island Canteen

quarta-feira, setembro 03, 2008

Joaquim Castro Caldas (1956-2008)


Um Apocalipse

agora é que tinha graça encher campos de relva de soldados e derrubá-los com os braços, pegar-lhes pelos capacetes e pô-los nos sítios do globo que nos apetecesse, agarrar no ar obuses e mísseis e espetá-los uns contra os outros, empurrar tanques por desfiladeiros, desligar centrais nucleares e bombas e amontoar dinheiro para o derreter e queimar, cobrir o jogo de lágrimas verdadeiras a conta gotas nos olhos dos homenzinhos armados em grandes, os que chamam melancolia ao amor e nostalgia à humildade, os que monopolizam e manipulam a história, informatizam a eternidade, esquecem-nos ou esquecem-se
in Mágoa das Pedras, Deriva, 2008

domingo, agosto 31, 2008

Hoje, 31 de Agosto, o Joaquim deixou-nos

«Escrevo à mão a quem se debruça ainda nas líricas impressas como as árvores curvadas sobre os lagos de água da chuva, marcando o livro com indisciplina, a quem ainda cheira a tinta, raízes e barro, a quem usa o romantismo para aliviar o tremor dos homens...».


Notícia estúpida esta, como são sempre as notícias que dão corpo à ausência. O Joaquim deixou-nos devagar, como quem nos estuda os gestos, com olhar matreiro e irónico. Como quem diz que já aí vem. Que foi só ali e não se demora nada.

sexta-feira, julho 25, 2008

As Aventuras de Sheila e Said: uma nova colecção juvenil da Deriva. A sair em breve. Para já, um blog

Clicar na imagem para aceder ao blog


No seguimento do Perigo Vegetal (à venda nas livrarias), de Ramón Caride, a Deriva publicará em breve a continuação desta saga das Aventuras de Sheila e Said. Assim, sairão, por esta ordem, A Ameaça na Antártida, O Futuro Roubado e a Negrura do Mar. Para já, um blog com o seu nome e com algumas explorações pedagógicas para estes livros incluídos no Plano Nacional de Leitura.

quarta-feira, julho 23, 2008

Filipa Leal à conversa com Catarina Nunes de Almeida. Nas Quintas de Leitura


Filipa Leal e Catarina Nunes de Almeida

Alegre, mas não muito“Allegro ma non troppo, un poco maestoso” foi o nome sugerido por Catarina Nunes de Almeida para a sessão das Quintas de Leitura dedicada à sua poesia. O Teatro do Campo Alegre recebeu a jovem poeta no dia em que era lançado o seu segundo livro, «A Metamorfose das Plantas dos Pés». O nosso diálogo começou não pela poesia de Catarina, mas pela saudade de Catarina, actualmente a ensinar Língua Portuguesa na Universidade de Pisa. Catarina, que escreveu um dia “Não moro não quero morar nunca”, que escreveu “Eu sigo por onde não há caminho”, que perguntou “Em que rua moras nesta cama?”.

Filipa Leal: em que rua mora em Pisa? [Risos] Na verdade, eu não moro em Pisa...
Mas trabalha em Pisa...Sim, trabalho em Pisa mas moro em Luca, uma cidadezinha muito simpática, um burgo medieval que me ensinou a andar de bicicleta outra vez. É uma cidade muito especial porque para além de ser a cidade do Puccini, é uma cidade muito poética, muito inspiradora... Acho que fui parar ao sítio certo.
Mas foi para lá porque preferiu Luca ou tratou-se de um acaso?
Eu comecei por estar num quarto em Pisa, mas calhou logo nos primeiros fins-de-semana ir passear a Luca...E apaixonou-se...Sim. Quem vai a Luca percebe por que é que se tem que ficar em Luca.
Fale-nos um pouco dessa sua experiência: porquê Pisa, porquê sair de Portugal? Prazer ou sacrifício pelo projecto?Antes de ir para Pisa eu já tinha estado em Itália, e não foi por motivos nada profissionais, foi por motivos até bastante passionais... [Risos]
E foi por isso que escolheu voltar?
Quando fui, estive em Nápoles, não estive ali. Depois a ideia de ir para Pisa foi realmente a de trabalhar, mas é sempre um bocadinho um sacrifício. Eu sou muito ligada às minhas raízes.
Custa-lhe estar longe?
Custa mesmo.
Mas pensa voltar quando acabar este projecto...
Sim, eu estou a pensar em voltar no próximo ano, até! [Risos]
Para Lisboa.
Sim. Ou para o Porto...Vamos ver se há motivos passionais...Por exemplo. [Risos]
Sempre desejou partir, ou foi uma opção mais tardia? Quando era criança tinha imaginado sair de Lisboa?
Não. Eu nunca fui muito de expandir-me no espaço, digamos assim. Sempre gostei muito de viajar, mas pensando em voltar. Era sempre por curtos períodos e nem consigo imaginar de maneira diferente.
Como é que tem sido a sua experiência na Universidade, nomeadamente no ensino de Português? Há muita gente a estudar Português em Pisa?
Em Pisa, se calhar não tanto como em outras partes de Itália, não sei porquê. Mas em Itália há muito interesse pela Língua Portuguesa. Começa logo pelo Brasil, mas depois quando eles têm contacto com a literatura portuguesa, com a nossa música, com a nossa cultura, até acabam por se voltar mais para nós e deixar um bocadinho o Brasil... E os alunos são muito queridos – tornaram-se os meus melhores amigos. Levam-me à praia, levam-me ao cinema... Porque quando eu cheguei lá estava um bocadinho perdida. Em Nápoles, estava no meio de uma relação, tinha amigos, havia pessoas que entraram logo na minha vida... E ali, em Pisa, estava um bocadinho deslocada no início, mas entretanto abriu-se um novo ciclo e foi muito bom.
Sei que tem desenvolvido outros projectos, a par do ensino da língua.
Sim, sim. Tenho procurado divulgar a cultura portuguesa, sobretudo a literatura porque é a área em que eu tenho feito alguns estudos. E não só: recentemente meti-me num grupo de teatro com os alunos...
Fazem teatro em português?
Sim, em português...
E é a Catarina que escreve as peças?
Foi uma adaptação do Torga, d’«Os Bichos», porque achei que seria fácil para eles. E correu muito bem.
Sente que esta saída, esta experiência, tem tido um impacto visível na sua poesia? Este novo livro contém esta experiência?
Sim, sim...
Dedica este livro de uma forma muito curiosa [“Ao Vesúvio, que me engoliu”]...
Eu dedico este livro ao Vesúvio porque grande parte do livro foi escrito em Nápoles. A experiência amorosa que está por trás foi vivida em Nápoles e achei que fazia todo o sentido dedicá-lo ao Vesúvio.
Mas é o lado passional ou o lado da distância que está aqui contido?
Também. Foi uma experiência nova para mim estar longe, e eu não sou nada de me ausentar por muito tempo – sou um bocadinho conservadora nisso. Mas não só. O livro foi publicado também em Itália e isso não se teria proporcionado se eu não tivesse estado ali. Conheci as pessoas certas, provavelmente, e o livro foi traduzido e curiosamente foi publicado primeiro em italiano e só depois em português... Eu não queria nada, mas foi assim...
O Jornal de Letras [JL] dedicou, em 2007, uma edição especial à dita “Novíssima Poesia Portuguesa”, e a Catarina foi uma das contempladas. Sente-se parte de uma geração? Há uma geração no sentido da proximidade de estilo, como no surrealismo, por exemplo? Há uma novíssima?
Sim, eu acho que me insiro na “Novíssima”, com certeza – na velhíssima seria difícil. [Risos] Percebe-se que há vários caminhos que estão agora a começar a ser trilhados. Eu não sei se não estamos todos ainda a olhar para os nossos pés – não sei se temos já a percepção de um estilo ou de uma corrente, porque a geração geralmente só se define quando já está fechada – não me apercebo muito disso mas se existe uma “Novíssima”, por que não fazer parte dela? Acho que sim...
Mas sente-se próxima dos poetas seus contemporâneos?
Sim, mas há sempre alguns com que nos identificamos mais...
No texto que publicou nessa edição do JL, fala de uma “cadência erótica e feminina que sobressai, como a que sobressai na natureza”. A relação íntima, quase carnal, com a natureza – como a própria fusão do homem com a árvore, por exemplo – é nítida na sua poesia. É uma das suas marcas mais visíveis, a par do erotismo. Aliás, há um exemplo para mim claríssimo destas duas vertentes, nos versos: “Um calor primitivo roça a madrugada: és tu o sol que me nasce entre as pernas”. Julgo que era a Anaïs Nin que dizia que “a pornografia revelava e o erotismo sugeria”. Interessa-lhe esse lado de sugestão, de provocação?
Sim, sim. Interessa-me sobretudo revelar as coisas mas deixando sempre um véu, deixando as sombras, os interditos, os silêncios...
Sente que encontrou um estilo? Reconhecer-se-ia de fora?
Sim, eu reconheço uma voz interior e já estou mais ou menos à vontade com ela. Se isso for um estilo, digo que sim.
Voltemos à expressão que utilizou - “cadência erótica e feminina” - mas agora para pegarmos no segundo adjectivo: “feminina”. Há uma escrita feminina?
Não sei... Eu começaria logo por dizer que o poeta é um fingidor. Não acredito muito que seja por o poeta ser homem ou mulher que vai reflectir masculinidade ou feminilidade.
Portanto um homem pode escrever um poema feminino e uma mulher pode escrever um poema masculino...
Exactamente. Porque é o sujeito que ele encarna. Eu posso ser uma mulher e escrever o poema mais machista deste mundo, porque estarei a ser esse fingidor...
A certa altura, escreve: “Não cabe mais ninguém nos meus poemas/ Agora serei só eu e as minhas romãs e os meus mestres espalhados pelos arrozais”. Tanto no JL como em ambos os livros, remete para os seus ‘mestres’. Neste poema, parece que também eles se confundem com a natureza... Quem são os mestres de Catarina Nunes de Almeida?
Se calhar, um bocadinho por influência da minha tese (tenho lido muitos textos orientais), os meus mestres são os orientais, os poetas do haiku... Eu busco a síntese.
“Na Primavera ando mais feliz”
Deixemos agora a poesia e cheguemos a si. Antes disso: nós somos a nossa poesia ou somos outra coisa diferente? Há alguns poemas seus que quase nos fazem corar: é assim atrevida também na vida real, ou é só na poesia?
É só na poesia! [Risos]Alguém cometeu uma inconfidência e me contou que costuma ficar mais distraída na Primavera... É verdade?
Sim, é verdade. [Risos] Ouço mais música na Primavera. Há mais sol e então reparo mais nas coisas... Sim, na Primavera ando mais feliz.
Escreve-se melhor na Primavera?
Sim... Ouve-se os passarinhos [Risos]...E depois escreve-se poemas eróticos... [Risos]Também. [Risos]
No seu resumo biográfico, diz que conheceu cedo o fascínio pelo teatro... Chegou a fazer teatro? Sim, formei-me um bocadinho. Fiz alguns workshops, algumas coisas amadoras, mas nunca trabalhei a sério.
Mas em Pisa tem participado?
Não. Enceno apenas. Mas na próxima eles já estiveram a insistir e por isso deverei entrar...
Agora vou fazer uma pergunta autobiográfica, se é que isso é possível: acha que o poeta é um actor frustrado?
Acho. Eu sou...
Eu também. [Risos]
Fala muita vezes (ou seja, os seus livros falam muitas vezes) de fábulas, como se a verdade estivesse nesse exercício de imaginação ou de memória antiga. É necessária essa evasão?
Sim, completamente. Eu sou muito assim, vivo muito no mundo da fantasia e não gosto de sair. Por mim estava sempre, por exemplo, no plano do cinema. Às vezes acordo cinematográfica.
Sente-se dentro de um filme? É como se faltasse apenas a banda sonora?
Sim, sim.
Por outro lado escreve: “Certamente uma palavra não é um lugar habitável”. Mesmo assim, prefere morar lá, na palavra?
Sim.
Porquê o título desta sessão? Porquê “Alegre mas não muito”? Isto tem um lado autobiográfico?Não. Bem, tenho momentos tristes, mas não é autobiográfico. Diz-se muitas vezes que os poetas são um bocadinho tristes...
É um mito, não é? [Risos]Sim, é um mito. [Risos] Neste caso, até foi porque já que havia uma relação com Itália na minha poesia, agora sobretudo no segundo livro, achei que fazia sentido trazer um título em italiano, e isto vem da Nona Sinfonia do Beethoven – é um andamento...Que ouviu na Primavera.
Provavelmente! [Risos]

Hypomnemata, de Pedro Eiras. No Rivoli até 27 de Julho

A não perder, no Rivoli, no Pequeno Auditório, o Hypomnemata de Pedro Eiras. Com encenação de Renata Portas, música de Joaquim Paixão e interpretação de João Henriques. Até 27 de Julho, às 21:30. Aos domingos, às 18:30.

Vozes do Alfabeto no Plano Nacional de Leitura


Mais um... agora, o Vozes do Alfabeto de João Pedro Mésseder e de João Maio Pinto foi chamado para o Plano Nacional de Leitura como leitura autónoma para o 3º ano de escolaridade. Fazemos assim o pleno: todos os livros infanto-juvenis da Deriva fazem parte no PNL. Parabéns aos dois.

sábado, julho 05, 2008

A Metamorfose das Plantas dos Pés, de Catarina Nunes de Almeida. Um novo livro de poesia

A Metamorfose das Plantas dos Pés, de Catarina Nunes de Almeida, que a Deriva agora edita, é constituído por três capítulos. O primeiro, que dá o nome ao livro, seguido de Corpo Floresta e A Descoberta do Fogo. Poesia caleidoscópica onde se conjuga o mar, as montanhas, as nuvens de onde vemos a terra e os homens que a habitam e sempre as árvores e os ramos como se cada um de nós pretendesse fazer parte e as disputássemos por um lugar exequível. Uma poesia que é uma orquestra para os sentidos. «…Das nuvens uma flor não é uma flor. / Duas flores não são duas flores. Das nuvens uma plantação de flores é apenas / um rectângulo amarelo / onde podem existir girassóis / guarda-sóis ventoinhas - / o que é que importa se por lá / também correm crianças?»


Catarina Nunes de Almeida nasceu em Lisboa, numa manhã de Agosto, a poucos passos do castelo. Muito cedo conheceu o fascínio pelo Teatro, frequentando diversos cursos e projectos criativos, mas acabou por se licenciar em Língua e Cultura Portuguesa, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Em 2005, começa a publicar poemas em diversas revistas literárias portuguesas e estrangeiras. Com o livro Prefloração (Quasi, 2006)recebe o Prémio de Poesia Daniel Faria e o Prémio do PEN Clube Português para a Primeira Obra. Entretanto, tem participado em diversos encontros internacionais de poesia. Iniciou em 2007 a preparação de uma Tese de Doutoramento sobre a poesia portuguesa contemporânea e as estéticas orientais, na Universidade Nova de Lisboa. Desde então, tem produzido alguns estudos ensaísticos, integrados em diversas publicações. Ensina actualmente Língua Portuguesa na Universidade de Pisa, onde tem organizado, com frequência, actividades culturais no âmbito da literatura portuguesa. A Metamorfose das Plantas dos Pés é o seu segundo livro de poesia, publicado em 2008 em Portugal e Itália.
Apresentações:
Porto, dia 11 de Julho, pelas 18:30, na Livraria Índex (Junto ao Palácio de Cristal). Com Pedro Eiras.
Lisboa, dia 18 de Julho, pelas 21:30, na Fnac Colombo. Com José Luís Peixoto.

quarta-feira, junho 11, 2008

Dragona de Xavier Queipo, já nas livrarias

Capa de Gémeo Luís



«Dragona» levou doze anos a ser escrito até chegar a esta versão publicada pela Deriva. Portanto, uma obra que se crê adulta e burilada, onde os pormenores aparentemente inócuos ou pouco importantes, atingem um significado muito difícil de contornar, nesta narrativa simultaneamente provocadora e atenta aos dias de hoje. A protagonista é uma imigrante argentina que choca com uma sociedade em transformações culturais e de valores profundas, como todas as sociedades modernas. Sendo bissexual e de gostos profusos, não se vê a refrear os seus impulsos agressivos ou ternos perante os outros, figurantes quase sempre de um teatro que se esqueceu de lhes dar um guião. «Dragona» prevê num futuro que é já hoje, um jogo onde nada é definitivo ou perene, de moral ou amoral. Nada, neste romance, é o que parece.



Xavier Queipo – é um escritor multifacetado. Poeta, ensaísta e tradutor que conhece bem Portugal, conta com várias participações no Correntes d’Escritas, Literaturas em Viagem e colaborou em vários programas de rádio e revistas literárias. Depois de editar o seu primeiro livro em língua portuguesa «Árctico e Outros Mares», em 1990, publicou, pela Deriva, «Bebendo o Mar» tradução de «Papaventos», em 2003, e «Os Ciclos do Bambú», em 2005. Detentor de vários prémios literários como o Prémio da Crítica Espanhola, Café Dublin ou García Barros, traduziu ainda para o galego Amin Maalouf, Conrad, Joyce e Guivert. Colabora regularmente nos sites Vieiros, culturagalega.org, na Revista Grial e no «Diário Cultural» da Rádio Galega, para além de uma coluna no semanário «A Nosa Terra». Em 2007, é membro do Dichterscollectif de Bruxelas e escolhido como poeta oficial da mesma cidade onde vive desde 1987. Da sua já vasta obra literária que toca em todos os géneros literários, como gosta de ressalvar, conta-se «Ringside» (1993), «Diários de um Nómada» (1993), «O Paso do Noroeste» (1996), «Malaria Sentimental» (1999), «O Ladrón de Esperma» (2002) e «Dragona» este mesmo romance publicado na Galiza em 2007, ano em que edita igualmente «Saladina».

quarta-feira, maio 28, 2008

Jorge Sousa Braga apresenta Filipa Leal. Este sábado, 31 de Maio no auditório do Planetário. Às 18h

Foto de Mafalda Capela Foto de Manuel Leitão
É já este sábado, dia 31 de Maio pelas 18:00h, no Auditório do Planetário aqui no Porto, que Jorge Sousa Braga apresenta O Problema de Ser Norte de Filipa Leal. Serão lidos poemas pelos elementos da Caixa Geral de Despojos. Estaremos lá...

A Deriva nas Feiras do Livro

Este ano a Deriva estará presente, em Lisboa, no Stand 154 da Centralivros. No Porto, no Stand F2, do Clube Literário do Porto.

Para além de todos os livros com os descontos habituais, temos promoções na área da colecção de narrativa (na imagem).

domingo, maio 04, 2008

Apresentação do livro Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas, com Pedro Eiras e Rosa Maria Martelo

Sexta-feira, dia 9 de Maio, pelas 21:00, no auditório da Biblioteca Florbela Espanca, em Matosinhos, apresentar-se-á o livro Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas. Com Pedro Eiras que coordenou a edição e Rosa Maria Martelo.
«Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas começou por ser um ciclo de palestras em torno de um desafio comum. Realizou-se no dia 11 de Outubro de 2007, em quatro sessões de comunicações e debates, no Auditório da Biblioteca Florbela Espanca, com organização da Câmara Municipal de Matosinhos. (…)
Durante todo o dia 11 de Outubro, um público numeroso e fidelíssimo acompanhou e dialogou com estas leituras da mais jovem poesia. O livro que agora se publica corresponde aos doze textos, revistos, eventualmente repensados a partir dos debates. (…)
Da mais premente contemporaneidade se fala também neste livro. Os doze autores chegaram ao ensaio precisamente no momento em que os poemas aqui lidos eram escritos. Pretende-se dar conta desse encontro. Alguns dos autores deste livro, embora se apresentem aqui como ensaístas, são também poetas revelados nas décadas de 1990-2000, e chegam a ser estudados em alguns ensaios.
Geram-se pois, ao mesmo tempo, coincidências e dispersão – igual-mente produtivas. Por um lado, há referências que se cruzam, repetem, permitem definir projectos do que seja a poesia hoje. Para uma escrita necessariamente em transformação, dizem-se assim algumas cartografias possíveis.»
Do Prefácio, por Pedro Eiras
O encontro «Jovens Ensaístas Lêem Jovens Poetas» aconteceu no Auditório da Biblioteca Florbela Espanca, em Matosinhos, a 11 de Outubro de 2007, organizado pela Câmara Municipal de Matosinhos, com concepção inicial e coordenação de Pedro Eiras.
Nesse dia, a todos os títulos memorável pelo seu interesse e pela novidade no campo da crítica e do ensaio literário, ouviram-se as intervenções de Marinela Freitas, Mariana Leite, João Paulo Sousa, Catarina Nunes de Almeida, Miguel Ramalhete Gomes, Raquel Ribeiro, Margarida Gil dos Reis, Helena Lopes, Joana Matos Frias, José Ricardo Nunes, Andréia Azevedo Soares e Daniel Jonas.
Da contracapa

sábado, abril 26, 2008

Paulo Kellerman e Luís Mourão na Arquivo, em Leiria, dia 29/04. Às 18:30


Na Livraria Arquivo, em Leiria, a 29 de Abril (terça) pelas 18:30, vai estar o Luís Mourão a apresentar o último livro de contos de Paulo Kellerman «Silêncios entre Nós». O Paulo e o Luís conversarão convosco e criar-se-á, esperamos todos, mais um bom momento de literatura em forma de conto e de conversas à volta dela. Em jeito de causa-efeito. Vamos lá estar todos e conhecer mais de perto este novo livro do Paulo.