sábado, fevereiro 25, 2017

Maria João Cantinho ao «Hoje Macau»: onde se fala da poesia e ensaio de Ricardo Gil Soeiro e do próximo romance na Deriva

Tens uma obra dividida pelo ensaio e pela poesia, e ambas reconhecidas. Gostava que falasses acerca do modo como entendes cada uma delas, no teu modo de escrita, e também em relação aos outros, ou seja como vês essas escritas para além da tua. 
Creio que sou mais reconhecida no ensaio do que na poesia, pois tenho publicado poesia em editoras discretas. Hoje, a ideia de fronteira, relativamente aos géneros, está mais esbatida e temos uma tradição fortíssima de poetas que são ensaístas ou vice-versa, o que mostra que a escrita não pode ser tomada de uma forma monolítica. A concentração da poesia (e a sua exigência de rigor e de contenção) é compatível com a respiração do ensaio. Eu diria que são passagens que se abrem (ou se fecham) e que a poesia bebe nas margens do não-dito, do não-explicável, do que não é racionalizável, do imediato, da pulsão, ao passo que o ensaio procura a claridade e a explicação ou, pelo menos, a sua tentativa. Temos uma tradição forte, na poesia contemporânea portuguesa, de autores que são também ensaístas, estou a pensar no Luís Quintais, mais pertencente à nossa geração, mas também em poetas como António Cabrita, Luís Miguel Nava (cuja precoce morte não nos deixou senão um conjunto breve de ensaios) Manuel Gusmão, Helder Macedo, o jovem poeta Ricardo Gil Soeiro (a meu ver o caso mais consistente desse paralelismo nos escritores mais jovens) e Gólgona Anghel, já sem falar do genial Jorge de Sena, Joaquim Manuel Magalhães, entre outros. Mas parece haver ainda um certo preconceito, de ambos os lados, em relação a tal. O que une o ensaio e a poesia, neste caso concreto, é essa capacidade de leitura e de interpretação das potencialidades da linguagem, o conhecimento profundo da própria tradição e dos autores. De uma forma geral, os ensaístas são grandes leitores e isso faz muita diferença (a meu ver) na poesia. Não entram nela de forma ingénua e desavisada. Devo dizer-te, no entanto, que a poesia portuguesa, um pouco contrariamente ao que se diz, está muito viçosa. Não quer dizer que seja tudo igualmente bom e o tempo há-de acabar por separar as águas, mas entre tanta coisa que se publica, neste universo de pequenas editoras, como a Douda Correria, a Língua Morta, a Averno, a Mariposa Azual e muitas outras editoras pelo país, cuja distribuição nos dificulta o acesso (estou a pensar nas editoras do Porto e de Coimbra), há muita coisa de qualidade. Em movência, proveniente de vários filões. Muitos poetas jovens que estão a fazer um excelente trabalho e é preciso esperar a evolução deles para avaliar a qualidade. As tertúlias, o trabalho militante de lugares que já são hoje de «culto», como o Irreal, o Povo, terças-feiras clandestinas, etc., são notáveis pela esperança que vieram criar para a jovem poesia portuguesa e fomentam o diálogo e o espaço propício à criação. Respeito muito quem trabalha assim, de forma militante, à margem das «facilidades» das grandes editoras, que sempre tiveram um trabalho mais facilitado. A poesia é hoje, mais do que nunca, um espaço de resistência, de contra-poder. E isso é profundamente político.

Outra das tuas actividades é a de coordenadora ou directora de um novo projecto cultural online chamado Caliban. Como surgiu essa ideia e como está a correr?
Não gosto muito de escarafunchar em histórias tristes, tanto mais que a Caliban é a história muito feliz do que se faz com finais tristes. Não gosto do termo directora, é demasiado formal para o meu gosto, prefiro o de coordenadora, é mais feliz e mais justo. O nome partiu desse engenhoso poeta que ambos conhecemos, o António Cabrita, mas houve muita gente amiga que se associou imediatamente ao projecto, com muito entusiasmo, também do lado brasileiro, amigos como Marcia Tiburi, Rubens Casara, Bartira Fortes, Renato Rezende. Os outros foram chegando, para utilizar uma expressão brasileira. Energia positiva gera mais energia positiva. A Caliban é lida em Portugal e no Brasil. Creio haver ainda alguma suspeita num certo meio intelectual português, que torce o nariz ao online, mas que nos lê «às escondidas», o que me diverte. É bom sinal. Todos os dias se somam novos seguidores e num universo tão pequeno como é o da literatura (não é um jornal genérico), com conteúdos ligados à arte e à literatura, à poesia, crónica, etc., não é de esperar que haja uma adesão maciça. Mas somos lidos nas comunidades portuguesas e recebo respostas muito positivas de quem mora longe e não tem acesso ao que se vai fazendo por cá. Creio que teremos de abolir este preconceito contra a revista electrónica (que o Brasil já não tem, por exemplo, ainda que ame o suporte de papel) para vencermos a resistência do leitor bem-pensante. As redes sociais, por seu lado, ao facilitarem a divulgação do projecto, têm sido óptimas para a sua divulgação, pois até agora, ao fim de seis meses, só uma rádio se interessou por nós. Mas estamos de saúde, é um projecto democrático e que pretende, antes de mais, dar voz e dar a conhecer quem não passa no crivo dos jornais e das revistas literárias, mas que, nem por isso, tem menos qualidade. Temos colaboradores (que têm tanta autonomia como eu ou o Cabrita) portugueses e brasileiros (e deste lado é preciso dizer que contamos com ensaístas e poetas extraordinários, como Alberto Pucheu, Renato Rezende, Luciana Brandão, Ney Ferraz Paiva, Vicente Franz Cecim, Marcia Tiburi, Rubens Casara, Marcio Seligmann-Silva, Danielle Magalhães, Yasmin Nigri, Bia Dias, etc.) que tão generosamente se dispõem a colaborar. É o tipo de projecto que fundas e deixas crescer livremente, espero que em breve possamos conseguir, de alguma forma, financiar, se houver interesse.

Tens um doutoramento em filosofia. Como entendes essa relação, em ti, entre a filosofia e a poesia?
É uma relação de profunda inquietação. Não que acorde angustiada a pensar em problemas existenciais todos os dias (os meus são mais prosaicos como pagar as contas, etc.), mas a filosofia esconde-se nos interstícios de tudo o que fazemos, uma espécie de animal intruso e invisível, que reclama o alimento, mas que também nos indica algo a partir dela, dessa necessidade de compreender, dessa paixão autofágica, como sabemos. Faço parte de uma linhagem poética que consideraria metafísica, não tenho nada a ver com o que se faz (e que eu respeito) hoje, a poesia do quotidiano, sou sempre movida pelos meus autores, muito atraída pela uma tradição mística, mas sem me deixar vencer por ela, nesse sentido de querer ser uma mística. Eu não quero ser nada, deixo que as palavras me guiem, o meu prazer é o da descoberta, esse trabalho da contenção da linguagem e da sua força, um trabalho de homenagem permanente, de dívida para com os meus autores, os meus temas. Não sei se o doutoramento tem aqui algum peso, pois eu nunca penso nisso nem quero que a erudição transpareça em exercícios fúteis de estilo, isso não me interessa para nada. Eu diria que a poesia me mantém à tona dessa inquietação filosófica. Sem a escrita acho que não vivia bem, não sei sequer se sobreviveria, nunca me aconteceu estar longe dela, desde que me lembro.

Que projectos para este ano?
Para já, uma tradução, que penso acabar este mês. Mas tenho um romance, que sairá em Maio, pela editora Deriva. Depois, vou atirar-me a um livro de ensaio, que conto publicar na Documenta/Sistema Solar. Só estou à espera de ter tempo para me consagrar a ele. E o resto vai acontecendo, é o trabalho académico, os textos ensaísticos que vou publicando em revistas, as conferências planeadas, um congresso internacional que estou a co-organizar, sobre memória e arquivo, com os meus ilustres colegas da Nova (Comunicação e História de Arte) e da Clássica (Centro de Filosofia). E a Caliban.

Entrevista conduzida por Paulo José Miranda em
http://hojemacau.com.mo/2017/02/24/maria-joao-cantinho-nao-quero-ser-nada/

terça-feira, fevereiro 07, 2017

«Palimpsesto», de Ricardo Gil Soeiro nomeado para o melhor livro de poesia, 2016, pela SPA

Já podemos divulgar a notícia e acreditem que é enorme a alegria de ver um dos nossos autores partilhar a nomeação para o melhor livro de poesia de 2016, atribuído pela SPA (Sociedade Portuguesa de Autores), com a Maria Teresa Horta e Daniel Jonas.Trata-se de Palimpsesto, de Ricardo Gil Soeiro e editado por nós no ano passado. Parabéns Ricardo Gil. Agora é esperar pelo dia 15 de Março!
SINOPSE  - O retraçar do traço, que nos diz da impossibilidade do pleno apagamento, é uma espécie de luto impossível. O sentido não tem fim. Porque no começo está a ruína, o sentido está sempre por vir. A sobrevivência do texto ulterior consuma-se através do sacrifício incompleto do texto precedente. A escrita, assombrada por um algures insituável, sobrevive por uma experiência aporética que nos magnetiza: essa invisibilidade visível inscrita no próprio traço, um resto espectral cujo frémito ainda estremece. Uma presença que eclode a partir da ausência e um desvelar-se que permanece velado. A hipótese do sentido, a esperança no encontro, emerge da dobra que se configura entre apagamento e re-aparição, entre caos opaco e júbilo perplexo, atando e desatando o laço incomensurável que, precariamente, reconcilia vida e morte.

ANO DE EDIÇÃO: 2016
NÚMERO PÁGINAS: 192
COLECÇÃO: Poesia
FORMATO: 13,5 x 20 cm
PESO: 978-989-8701-22-0
PVP C/ IVA: 16,50 Euros

PEDIDOS A: infoderivaeditores@gmail.com COM INDICAÇÃO DE NOME E MORADA. 



Ricardo Gil Soeiro - Poeta e ensaísta, Ricardo Gil Soeiro é Doutorado em Estudos Literários pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde é investigador do Centro de Estudos Comparatistas, desenvolvendo pesquisa sobre literatura comparada, teoria da literatura e estudos de memória. Publicou poesia: O Alfabeto dos Astros (2010), Labor Inquieto (2011), Bartlebys Reunidos(2013). Em 2012, veio a lume a antologia poética L’apprendista di enigmi, pela Aracne editrice, Roma. Alguns dos seus poemas foram já traduzidos para castelhano, catalão e alemão. Está representado em diversas antologias, em Portugal e no estrangeiro. Publicou ensaio: O Pensamento Tornado Dança,Gramática da Esperança e, mais recentemente, The Wounds of Possibility(Cambridge Scholars Publishing, 2012) e A Sabedoria da Incerteza: Imaginação Literária e Poética da Obrigação (Edições Húmus, 2015). O livro Iminência do Encontro foi galardoado com o Prémio Primeira Obra do PEN Clube Português em 2010.

Outro livro de Ricardo Gil Soeiro editado pela Deriva Editores



segunda-feira, fevereiro 06, 2017

Recensão crítica no Expresso de José Mário Silva a «Chiaroscuro», de Catarina Costa

Dos Espaços Confinados, de Catarina Costa, foi o segundo livro da autora que foi editado pela Deriva em 2013 e uma das obras referidas por José Mário Silva nesta sua recensão crítica no Expresso desta semana. É a nossa recompensa, como editores. Ler um escritor, uma autora, uma poeta e reparar que há ali uma verdade, uma força, um impulso que vai torná-la maior ainda. Parabéns, Catarina.

http://derivaeditores.blogspot.pt/2013/10/dos-espacos-confinados-catarina-costa.html
http://www.fnac.pt/Dos-Espacos-Confinados-Catarina-Costa/a737367
https://www.wook.pt/livro/dos-espacos-confinados-catarina-costa/15309813
http://derivadaspalavras.blogspot.pt/2013/10/entrevista-catarina-costa-autora-de-dos.html



sexta-feira, fevereiro 03, 2017

Epístola aos jovens atores para que seja dada a palavra à palavra, Olivier Py


Manual de Sabotagem, de Elfriede Jelinek


Call Centers, de João Carlos Louçã


A Vida entre Nós, A Sociologia em Carne Viva. Na Nova Almedina, Coimbra


Gonçalo Vilas-Boas, Carlo Ginzburg, António Alves Martins e Ricardo Gil Soeiro

Revisitar Annemarie Schwarzenbach, de Gonçalo Vilas-Boas
Palimpsesto, de Ricardo Gil Soeiro
Cidades Materiais, de António Alves Martins
Morelli, Freud e Sherlock Holmes, Indícios e Método Científico, de Carlo Ginzburg