sexta-feira, janeiro 27, 2012

Bailias, Catarina Nunes de Almeida [não é tarde]



"Se bem tenho notado, a poesia teve enorme destaque nos balanços que os jornais fizeram dos melhores livros do ano passado: o destaque da ausência. Ora, isto é um desmesurado favor que se faz à prosa, sobretudo a portuguesa. A verdade é que em 2011 pelo menos dois livros de poemas estiveram perfeitamente à altura dos melhores acontecimentos literários e, se a um deles ("Bailias", de Catarina Nunes de Almeida, que saiu na Deriva) já é tarde para dar aqui o espaço merecido, vamos muito a tempo de conceder toda a atenção ao mais recente, que é esta inesperada "Observação do Verão", de Gastão Cruz." (Gustavo Rubim, Ipsilon, 27.1.12)

sábado, janeiro 21, 2012

Estranhas Criaturas





MEDUSA

   Há muitas coisas belas. Medusa é uma delas.
   Um penteado de pecados fica bem ao mortal, um olhar petrificante tudo o que pode almejar quem anda pela vida mais que por ódio, amar.
   No olhar de Medusa, vejo Rosa Parks sentada para que outros pudessem levantar-se, vejo os punhos erguidos e as luvas negras de Tommie Smith e John Carlos nas olimpíadas da sonsice que é o adiamento das guerras na paz podre das medalhas, vejo Mahatma Gandhi fiando a fome de justiça e liberdade que nenhuma boca cheia de alheamento poderá compreender, vejo o julgamento de Sócrates, a cicuta bebida de um trago como uma lição perdida na história da nossa incomensurável apatia, vejo Galileu Galilei, Joana d'Arc e até Jesus Cristo eu vejo, como tantos outros que como estes vivem hoje nos bolsos de uma juventude reles que julga ser possível apagar grandes fogos sem fogos.
   Vejo lições de entrega, vejo quem ousou dar-se por si próprio e pelos outros sabendo que entregar-se era descobrir-se e que descobrir-se nada mais é do que lançar-se no abismo da dúvida, da incerteza, no desconforto de uma missão que apenas reivindica alguma limpeza neste mundo de auto-justificado nepotismo, vejo o homem revoltado como cabelos venenosos, despenteado pela noção clara de que desprezar é consentir e consentir é ser cúmplice da porcaria em que chafurda quem mais não sabe do que adormecer em berço de ouro a palha de que se alimenta.
   Há muitas coisas belas. Medusa é uma delas.
   Da sua cabeça decepada hão-de nascer cavalos alados. E nem depois de morta deixará de petrificar quem fite nos seus olhos a verdade que nos aponta: de pedra somos feitos, se desapaixonados e indiferentes. (Henrique Manuel Bento Fialho, Estranhas Criaturas, Deriva)



segunda-feira, janeiro 02, 2012

Conto da Travessa das Musas, Vozes do Alfabeto e O Aquário

  
Conto da Travessa das Musas, Vozes do Alfabeto, O Aquário são três livros infantis que  têm muito  para ensinar. Um mesmo autor - João Pedro Mésseder - e três ilustradores diferentes: Manuela São Simão, João Maio Pinto  e Gémeo Luís.
 
O Conto da Travessa das Musas, o mais recente título, é uma viagem por um tempo antigo - uma história que se passou no Porto há muitos anos.

Uma história de um menino sem tempo para ficar quieto. Uma história que fala de mercearias, de lojas de miudezas, de carrinhos de linhas e fivelas, de José Gomes Ferreira, de um polícia gordo e pachorrento, de carrinhos de madeira e de flocos de neve (os rebuçados...). 


Uma história de um tempo em que os meninos brincavam na rua. Uma história que se passa no Porto, no centro do Porto com o João. 
 Uma história que vale bem a pena o desafio de procurar a Travessa das Musas.



«Álbum poético de dimensões reduzidas, Vozes do Alfabeto é mais um exemplo da criatividade associada à exploração das potencialidades da língua portuguesa, das suas grafias e dos seus sons. As letras do alfabeto são o mote para um conjunto de poemas muito divertidos, onde os efeitos sonoros são constantes. Herdeiros das rimas infantis, em particular das lengalengas, dos trava-línguas e de outros géneros e formas da tradição oral, os textos exploram uma dimensão lúdica da literatura ao mesmo tempo que, implicitamente, promovem o desenvolvimento de competências fonológicas, linguísticas e literárias. As ilustrações, muito coloridas, ocupam as páginas ímpares da publicação e partem do texto que acompanham, ligando a letra aos objectos e/ou personagens. Funcionando quase como um jogo, o pequeno álbum revela-se particularmente adequado para os primeiros leitores.»
Ana Margarida Ramos in Casa da Leitura


O Aquário
Uma história de peixes, cores e sabores para os mais pequenos. Um aquário é também um mundo em miniatura, onde se jogam relações entre iguais e diferentes, novos e velhos, e onde se geram preconceitos e ideias feitas. As ilustrações ajudam a compreender situações e personagens, sem deixarem de construir um cenário onírico e sedutor.

O Aquário  tem evidente recursos para a leitura orientada na sala de aula. Aprovado e recomendado pelo Plano Nacional de Leitura para o 3º ano, tem uma amplitude muito maior de intervenção nas escolas como comprovam as experiências descritas aqui aqui aqui e aqui

Crise de versos, Stéphane Mallarmé

Crise de versos, Stéphane Mallarmé
Elíptico, extremamente condensado, interrogando tudo quanto poderia distinguir a poesia dos usos comuns da linguagem, o texto de Crise de Versos é, ao mesmo tempo, um diagnóstico e uma profecia. Por um lado, procura surpreender a dissolução de versos tradicionais, em particular do alexandrino (o verso oficial por excelência), ao longo da segunda metade do século XIX e sobretudo após a morte de Victor Hugo. Diagnóstico difícil de uma experimentação formal então ainda em curso: o que nos surge hoje como conquista definitiva e já distante (em termos de livre invenção de metros, cesuras, formas gráficas) era no tempo de Mallarmé um acontecimento recente, plural, a necessitar com urgência de teorização. Por outro lado, Crise de Versos antecipa as poéticas dos modernismos e das primeiras vanguardas, ao enfatizar a produtividade da tensão entre a busca de um princípio construtivo, que asseguraria a impessoalidade, e a dissolução das formas canónicas.