sábado, setembro 24, 2022

«Ibéria Esvaziada», de Carlos Taibo

Edição da Letra Livre, prefácio de Filipe Nunes, tradução de Pedro Morais

Carlos Taibo já não é propriamente um desconhecido entre nós, embora devêssemos estar mais atentos ao seu trabalho que pode ser considerado polémico pela novidade das suas ideias que são sustentadas em casos directamente conhecidos por ele, em estudos sérios e dados de outros cientistas; mas é inegável a sua importância pelas possibilidades reais de querermos uma fuga ao colapso que se aproxima ou que já está entre nós sem que o saibamos.

Este livro é de 2022 e foi escrito em plena pandemia cujo combate o autor considera ter sido um ensaio para as medidas autoritárias e ecofascistas, mas com outros motivos, para além das sanitárias, para nos confinar aos milhões pelo mundo fora. Atenção que não estamos a ter uma visão negacionista; falamos, sim, de um ensaio autoritário e musculado a populações inteiras que se poderão aplicar a outras situações sejam elas pandémicas, militares (uma guerra, por exemplo), contestações sociais ou políticas. 

Em 2019 já aqui falávamos deste professor de Ciência Política na Universidade Autónoma de Madrid, Carlos Taibo, quando a Letra Livre o Jornal Mapa nos ofereceram o seu livro «Colapso» e aqui foi escrito isto: http://derivadaspalavras.blogspot.com/search?q=colapso . O excelente prefácio de Filipe Nunes abre-nos todas as perspectivas do trabalho de Carlos Taibo em «Ibéria Esvaziada». Perante o despovoamento assustador de uma Ibéria do interior cada vez com menos gente, com serviços sociais inexistentes, sem escolas ou serviços de saúde, correios, transportes públicos, digam-nos se o colapso não chegou já, quer em Portugal ou Espanha.

Mas fixemo-nos na apresentação de Filipe Nunes: «Taibo assume essencialmente um ''optimismo patológico'', contrastante com um ''pessimismo congénito'' que poderia fazer transparecer da sua teoria do colapso. O desafio a que nos convoca é precisamente o de questionar como queremos que seja a sociedade pós-colapso. E desafia-nos literalmente a lançar mãos à terra, pois o colapso, esse, já esta entre nós. Estamos todos cientes do horizonte desesperante das alterações climáticas e do esgotamento das matérias-primas energéticas fósseis, pelo que, num mundo em colapso, prefere sublinhar as consequências positivas que lhe estão associadas: a rerrularização, uma maior autonomia local e fragmentação e o retrocesso dos fluxos hierárquicos.» 

Ora, nestas três consequências que serão ao mesmo tempo propostas para o colapso que já se vive ou para o pós-colapso que, segundo os mais optimistas, ainda não veio ou, sequer, virá, Carlos Taibo dá-nos toda uma perspectiva não só de sobrevivência, mas igualmente de possibilidades de felicidade e bem-estar baseado em índices que nada terão a ver com a existência de dinheiro especulativo das sociedades industriais de hoje. O que nos propõe: as associações de apoio mútuo, as correntes de solidariedade humanas e a síntese muito interessante entre as sociedades pré-capitalistas e as redes anticapitalistas que terão de se adaptar, sem sectarismos inúteis, a uma nova realidade. É esta a grande diferença entre o ecofascismo que recusa o crescimento industrial e financeiro especulativo enquanto nos vai enchendo as serras de moinhos eólicos, uma nova mineração brutal e vai arranjando argumentos para a continuidade da carbonização, adiantando que a Humanidade sempre soube encontrar soluções tecnológicas para um colapso, e, por outro lado, uma rede humana que aposta no descrescimento, na autonomia política das decisões das populações, no valor de uso e nas trocas solidárias entre grandes bioregiões. Tudo está em aberto. 

Fixa-se igualmente na onda cada vez maior dos neo-rurais: pessoas que não suportam já a vida nas cidades e na ditadura dos automóveis, nos preços exorbitantes das casas e das coisas incluindo os produtos de primeira necessidade, no desemprego, nas altas taxas de criminalidade junto com o autoritarismo latente e cada vez mais arrogante e brutal das instituições políticas e governos, nas doenças pulmonares e cancros cada vez mais agressivos, num individualismo insuportável, etc., etc, Carlos Taibo avisa-nos que esta passagem da cidade para o campo não é propriamente fácil e, muitas, têm-se mostrado um fracasso. Talvez a reprodução de um individualismo urbano para o campo não seja a melhor escolha. No campo, ou se encontra uma rede solidária de trocas, de saber ou materiais, ou esse fracasso não tarda a aparecer.

Voltemos ao prefácio de apresentação de «Ibéria Esvaziada», de Taibo por Filipe Nunes quando cita Júlio do Carmo Gomes num artigo, creio, que inscrito num número do Jornal Mapa: «Como escreveu JCG, invocando os indícios da nossa ancestralidade política, trata-se do resgate da cultura comunitarista como potência política e génese poética, raízes inseparáveis para problematizar as políticas acerca da vida». Este movimento do neo-ruralismo vai crescer, sabemo-lo, até porque os exemplos se multiplicam em toda a Europa que ainda nada no seu fausto de coisas sem grande ou nenhuma utilidade. Em França 25% da agricultura biológica já alimenta o país através do trabalho das ZAD, em Espanha experiências que vieram de 36-39 estão a repetir-se nos Pirenéus e no interior também ele esquecido dos governos, em Portugal a experiência da Reforma Agrária de 74-75 não deixou grandes rastos num proletariado camponês em vias de desaparecimento, mas o movimento cooperativo deixou algumas marcas assim como em aldeias do interior do Alentejo e Trás-os-Montes que tem conhecido um movimento nada negligenciável de famílias jovens que chegam das cidades, tal como na Grécia e sul de Itália.

Carlos Taibo, significativamente, termina este livro interessantíssimo com o título de «silêncio», um valor a que as cidades já não conhecem. Recorreu a Vergílio: «Lavradores se considerariam bem de sorte se tivessem inteira consciência das dádivas enormes que recebem. É a eles que, longe das discórdias, longe das armas, dá a natureza generoso sustento que os mantém.» e ao renovador do cristianismo, no século XIV, Thomas de Kempis: «Procurei repouso em todo o lado e não o encontrei em lado nenhum, excepto em algum recanto com um livro».

Talvez haja um pequeno repouso ao ler este livro, mas que paradoxalmente nos convida a perscrutar todas as verdadeiras possibilidades de uma vida útil, é uma verdade muito difícil de contrariar. E ainda bem.

António Luís Catarino

segunda-feira, setembro 05, 2022

«Fragments of an Anarchist Anthropology», de David Graeber

 

Talvez dos livros mais importantes de David Graeber, a seguir ao seu monumental «Debt, the first 5000 years» e «Trabalhos de Merda», que me pronunciarei em breve sobre ele. Dizem que já está esgotado e não me admira. É um livrinho de 100 páginas, mas bem elaborado e com uma síntese impecável sobre o que é o Anarquismo, hoje. Creio, não errar se disser que provavelmente ele escreveu-o para a galáxia marxista, mais do que para anarquistas. Por mim, apanhei-o a tempo e dou por mim a pensar que anarquistas haverá que talvez reajam com alguma surpresa e desconfiança o cada vez maior número de pessoas que se aproximam das suas teses e que leem com novo vigor as teses de Proudhon, Bakunine (não sabia que ele traduziu «O Capital» de Marx para russo!) e Kropotkine. O mais interessante é que o editor da «Prickly Paradigm Press» é o nosso conhecido Marshall Sahlins que escreveu o icónico «Âge de Pierre, âge d'abondance - l'économie des sociétés primitives». No seguimento da minha afirmação anterior também não será de estranhar as referência a Castoriadis, aos situacionistas, aos autónomos italianos e americanos e aos conselhistas, segundo ele os marxistas mais próximos à prática anarquista. Já não nos admira tanto a sua referência aos anarquistas e libertários como John Zerzan, um primitivista que editei na Deriva com o seu «Futuro Primitivo» e que esteve nas grandes assembleias de Seattle e ao recém-falecido Peter Lamborn Wilson autor das «Utopias Piratas», também editado pela Deriva. Com estes autores mantive uma correspondência bastante frutuosa. Gostei bastante deles e sendo este um fator subjetivo, vale o que vale, mas não queria deixar passar este facto em branco. Portanto, não tendo já essa possibilidade, peço que traduzam este livro para português, pela sua importância. Penso que a Antropologia cá da terra, e as pessoas que ainda não se recusam a ler e a pensar criticamente, só teriam a agradecer e não é com surpresa que vejo algumas afinidades com o livro de João Carlos Louçã no seu «Pensar a Utopia-Transformar a Realidade» principalmente na aproximação do marxismo ao anarquismo.

Neste livro, escrito em fragmentos e apresentando-nos pensamentos aparentemente desligados uns dos outros (como aliás toda a técnica da escrita fragmentária) reconhecemos uma sólida formação de antropólogo que não foge aos problemas vários do capitalismo e da construção de alternativas. São a construção desses paradigmas de liberdade individual e coletiva que nos leva a conhecer não só algumas práticas ditas de sociedades primitivas, mas criticá-las também. Provavelmente, teremos de pensar em alternativas ao capitalismo em moldes completamente novos. E é esse o desafio da democracia direta que nos traz David Graeber, além de outros desafios. Passa a pente fino a fixação ocidental (eis um conceito que deve acabar, o de «ocidental») na «democracia» ateniense e espartana como fossem o início de toda a governabilidade, quando existiam povos que usavam o consenso democrático muitos milhares de anos antes. A própria ideia de «representação» é de um dos maiores logros, ele chama-a de «trap» o que é uma palavra bem que acentua melhor o «nosso» sistema político. 

Deixo para o fim o inteligente debate imaginário entre os sempre céticos de uma nova liberdade sem capitalismo, pode-se chamar anarquismo ou não, e aqueles que acreditam numa nova era alternativa, com bases sólidas de organização popular, autónoma, consensual, de vizinhança e de solidariedade comuns. Impossível? A História mostra-nos que não, mas omite as experiências livres que ocorreram desde há dois séculos e que ainda ocorrem em Chiapas, nas assembleas argentinas (após a sua derrocada económica) ou nas ZAD's autónomas por todo o lado na Europa, Estados Unidos ou Canadá. Opondo uma prática não-violenta à violência brutal do capitalismo (ele goza com o adjetivo «tardio») e a que já nos habituámos. Infelizmente. Até porque é cada vez mais letal.

É evidente que não se esgota aqui, nesta minha ficha de leitura, a riqueza das ideias de David Graeber e o pensamento crítico com que nos brinda em cada página. Que nos faz pensar. Mas é um desafio interessante ver que os antropólogos estarão na primeira fila do que ele chamaria de novos paradigmas, porque têm o saber necessário para desconstruir um sistema que nunca funcionou ou, se o fez, foi à custa de escravatura, genocídio de milhões de indivíduos, racismo, nacionalismos que levaram a guerras fratricidas, exploração desenfreada de recursos e criação de refugiados expulsos das suas terras ancestrais. E tudo isto através de estruturas militares, prisionais e burocráticas.

Ah...e Portugal e Espanha são referidos, tal como o sistema colonial francês e inglês. As monarquias ibéricas não eram muito mais complexas que as do Congo como se verificou nos seus primeiros contactos. Mas isto não é dito nas disciplinas académicas atuais. O que faz com que a História hoje se apresente como uma enorme omissão, quando não mentira estudada, como o fazem os media atuais, ou a sociologia que pretende «perceber» as «sociedades» confundidas propositadamente com os «estados».

Termino com uma provocação de Graeber: «por que razão há tantos académicos marxistas e só na antropologia é que encontramos um número assinalável de anarquistas?»

domingo, setembro 04, 2022

«Os Cátaros», Jesús Mestre Godes

 

«Os Cátaros - Origens, Desenvolvimento, Perseguição e Extinção», do catalão Jesús Mestre Godes, não é um livro histórico no sentido mais científico do termo porque influenciado por um nacionalismo algo exacerbado do autor. É verdade que se socorre de historiadores contemporâneos e escritos evos de trovadores e clérigos, mas trata-se mais de uma súmula de investigações alheias do que propriamente nascidas de Godes. Depois, este livro de 1995, e publicado em português pela Pergaminho em 2001, ignora alguns estudos essenciais sobre o tema na sua bibliografia. Um apontamento singular: a tradução é de Jorge Fallorca.

O livro é um bom início para se introduzir um tema histórico bem mais complexo do que parece à primeira vista e em que o turismo do sul de França conseguiu arredar a seriedade necessária para o analisar. Ainda me lembro da primeira vez que visitei o castelo de Carcassone, um dos locais cátaros de maior evidência: as muralhas estavam então cercadas literalmente por autocaravanas que assediavam o local com crianças munidas de espadas de madeira e elmos combatendo-se e berrando com ímpetos de vitória. Uma disneylândia! O calor era bastante e os franceses banhavam-se em chuveiros improvisados bebendo cerveja dita artesanal com rótulos de gordos abades cátaros. Nem parei ou entrei no castelo! Saí logo dali para fora em direção à Montolieu, uma pequena vila occitânica onde se pode encontrar 30 livrarias e alfarrabistas. Permaneci lá durante 3 dias incríveis, visto que o programa cultural era exatamente ao contrário do que se faz aqui, onde o novo-riquismo impera: bastava um piano e um pianista e tínhamos uma noite perfeita! No outro dia uma contrabaixista e mais um dia com uma saxofone. De livros, falaremos noutra ocasião tal a diversidade e importância.

Tudo indica que os cátaros defendiam, dentro do cristianismo, um maniqueísmo com influências, ao que tudo indica, do filósofo persa dualista Mani que também inspirou o zoroastrismo. Para eles, que se chamavam «puros» havia dois mundos: o mundo do mal, material, e o mundo do bem, o das ideias, onde estava Deus e que era intangível. Acreditavam em Jesus, filho de Deus, enviado à Terra e que fazia parte de um plano mais geral, que terminaria no apocalipse, numa luta gigantesca entre Deus e o diabo, com a vitória do Bem. Não será de estranhar pois, que a Igreja do século XII começasse a ser criticada pelos cátaros pelos seus luxos, simonias, indulgências, pecados ditos venais dos clérigos e demasiado ligada ao poder temporal feudal das violências e ocupações de terras e lugares. Nada que não esperássemos, mas que tiveram razão antes de Lutero é verdade, e talvez isso explique a fúria inexplicável, nalguns pontos da história, contra os albigenses, ou seja, os cátaros. A inquisição dominicana (com o próprio Domingos de Gusmão à cabeça) liderou esse conflito, primeiro de um modo conciliar, depois, de pura repressão brutal principalmente após a sua morte. Daí a antipatia e afastamento que muitos cristãos católicos ainda hoje sentem por esta ordem. Os franciscanos esses, embora tenham pregado no Languedoc estão longe de terem responsabilidades nas fogueiras levantadas pelos dominicanos e pelos príncipes franceses. Os papas que de uma maneira ou de outra criaram bulas anticátaras, nos vários concílios de Latrão, foram Inocêncio III, Honório III e Gregório IX, todos bem conhecidos da História de Portugal.

Disse «franceses» propositadamente. A população do Languedoc nunca se sentiu francesa. Faria parte de uma «renaixence» cultural muito assente na prática trovadoresca e literária onde pontificava igualmente a música e o teatro. Isto em pleno século XII e XIII onde o comércio florescia e enriquecia os burgueses de Montpellier, Toulouse, Foix, Pérpignan, Agen ou Narbonne. Não é impossível que este comércio com rotas orientais tivessem tido influência na criação da religião cátara trazida por comerciantes da Pérsia ou mesmo por comerciantes do Languedoc vindos dessas paragens.

A verdade é que a chamada heresia existiu e promovia a pobreza, a errância pregadora, a humildade, a austeridade e até um novo papel da mulher na condução dos serviços religiosos cátaros. Viviam em comunidades e repartiam tudo em igualdade. Tinham bispos, perfeitos e perfeitas e mantinham com o povo uma constante presença o que originava um processo de simpatia que irradiava por todo o Laguedoc e para lá dele: pensa-se que havia cátaros na Catalunha, em Aragão e até em Marselha e Grenoble. Ora, esta vida cultural e comercialmente mais ativa gerou um afastamento de um norte francês mais rural, feudal que invejava e ambicionava estes territórios incorporando-os em França, o que veio a acontecer com Luís IX, após batalhas, conflitos legais, repressões, ataques, traições de toda a espécie e principalmente, entre 1209 e 1219, em cercos violentos que originaram centenas de milhares de mortos, não contando os que sofreram as torturas e as fogueiras da Inquisição e as sevícias para alguns «inenarráveis» nomeadamente para historiadores da época, mesmo que estes fossem do «outro lado». Assim foi que até o Papa Honório III teve de lembrar a Simão de Montfort, o principal verdugo e militar de França, e já conhecida a sua brutalidade em cruzadas contra Constantinopla e Jerusalém, que «nem se trataram assim os sarracenos!» pedindo-lhe mais moderação e razoabilidade na repressão, conselho que não foi de todo seguido.
Mas foi assim que a história se passou: a dos Cátaros e do catarismo que ainda se «mexia» no início do século XIV até à tomada mítica de Montségur com a autoimolação dos principais perfeitos e perfeitas cátaros. A rendição do seu povo veio depois, com aniquilação pensa-se que total, da sua população.

As questões que me tem atravessado desde sempre, como licenciado em História, é a falta de elementos escritos do catarismo o que se compreende até uma certa parte: para os perseguidos era necessário esconder qualquer vestígio da sua religião, assim como para os perseguidores era necessário cortar o mal pela raiz destruindo tudo o que encontravam que lembrasse a «heresia». Só dispomos, ao que se sabe, de quatro fontes escritas cátaras. Quanto à arqueologia, esta tem sido mais feliz, embora o mito turístico do «Santo Graal templário escondido em Montségur» ter estragado tudo! Ou quase tudo, não exageremos...

No entanto, há a última questão, esta, quanto a mim, a mais densa: para onde foram os refugiados cátaros? Sabemos que os houve, em diversas vagas, e o contrário é que seria para admirar. Há provas da presença deles no século XIII e XIV em Aragão e nos Condados de Barcelona e sabemos que Pedro I de Aragão (que vem precisamente a morrer na Batalha de Muret) tinha simpatias cátaras assim como milhares de nobres e cavaleiros do Languedoc que tiveram de jurar obediência a França após a derrota de Muret e principalmente na de Toulouse, cuja resistência condal e popular ficou nos anais da História. 

Mas os cátaros que conseguiram fugir, permaneceram somente nas faldas dos Pirenéus? Ora, aqui reside a minha principal dúvida: se Castela estava politicamente com os cátaros porque via neles a possibilidade de enfraquecer o reino francês, tal como a Inglaterra e o Imperador do Sacro Império alemão, (prometeram ao cátaro Conde de Toulouse, Raimundo VII, ajuda em Muret que depois traíram por influência papal), será que encontraram no lado de cá dos Pirenéus algum refúgio? Se sim, foram mais avante até Portugal? Vejamos: não é de todo impossível porque no século XII o recentíssimo Portugal estava a braços com problemas sérios de povoamento e as nossas casas senhoriais tinham bastantes contactos com Aragão como sabemos. No século XIII começa-se a povoar as arroteias em Portugal e será não com alguma estranheza ou pela pura convicção (como queiram!) que vemos o nome Catarino que nos remete para o étimo de «cátaro» difundido nas regiões onde pontuavam os pântanos e as arroteias como Viana do Castelo, Ílhavo, Aveiro, Cantanhede e Grândola, por exemplo. Mais tarde estes territórios também serviram para as alforrias dos escravos, como é comprovado por várias monografias destas regiões. Fica a dúvida, que ainda permanece, por que razão este pedaço importantíssimo da História europeia, a da «heresia cátara» e da consequente debandada dos seus fiéis da Occitânia nunca foi estudada a fundo em Portugal.