As notícias chegadas do País Basco no último, digamos assim, mês e meio, são muito animadoras para o Ministério das Finanças português. Pelo conteúdo de declarações em comícios e actos públicos, o líder independentista pirenaico, Arnaldo Otegi, já foi detido várias vezes, levado a tribunal especial anti-terrorista outras tantas e, para poder voltar a casa, teve de pagar ao Estado espanhol fianças de quase 400 mil euros, uns 80 mil contitos para o erário público.
Trata-se, sob a alcunha de "fiança judicial", da fórmula espanhola para o chamado "imposto revolucionário" que a ETA tinha criado nos idos de 1960 e poucos. Em nome da lei que garante a liberdade de expressão, um indivíduo discursa e a polícia prende-o. Presente ao juiz de instrução do tribunal especial anti-terrorista, em Madrid, são-lhe fixados 250 mil euros de cada vez que lá cai por não ter dito o que a liberdade de expressão manda que todas as pessoas digam. E assim ad eternum...
Claro que isto são chinesices de bascos e espanhóis que, a julgar por alguns letrados cronistas lusos, andam há séculos entretidos a jogar ao gato e ao rato, com aquelas coisas das bombas e das torturas por não terem mais que fazer. Não são gente ocupada como eles, cronistas portugueses, cuja generalidade não tem sequer tempo para gerar uma ideia minimamente atendível. Não são gente como o nosso ministro das Finanças, aflito com a imaginação a acabar-se-lhe para inventar novas formas de extorsão no seu super-wrestling contra o défice, luta de titãs, quem esmagará quem no final?...
Porque, aqui para nós, a verdade é que também nós, nós portugueses em geral, não somos capazes de criar coisas como os bascos, que dão para extorquir dinheiro em nome da lei... tivemos o frágil epifenómeno das FP-25 (quem se lembra?), mas uma coisa assim boa, valente, tributável como uma ETA, vá lá, uma prima dela afastada que fosse, isso não, não temos... não nos está no jeito.
Pois teremos de inventá-la. E a proposta é que o ministro das Finanças passe a dar conferências de imprensa encapuçado, como há uns trinta anos faziam alguns dos mais hiper-demoráticos penas d'ouro da nossa imprensa mais fadista e popularucha. Que seja o Ministério das Finanças a formar a sua própria organização terrorista. Que os juízes trabalhem o Verão inteiro a decretar fianças e mais fianças que vão direitinhas parar ao combate ao défice. Se entre a algaraviada de espanhol que se ouve pela Páscoa e na canícula pelas calles portuguesas houver bascos - dentro também! E fiança! Não esquecer a fiança.
E assim, sim. Os nossos mais destemidos colunistas, fatigados de verberar guerras alheias, de insultar terroristas de outras geografias cujos nomes mal conseguem pronunciar, passam a ter carne fresca. Em vez de se arriscarem apenas a ficar roucos, com os concursos de gritaria que fazem a ver se as vozes lhes chegam ao céu, aplicarão toda a sua verrina contra produto doméstico. Do bom, não são esses filo-terroristas encapotados que às vezes a democracia deixa que ponham a cabeça de fora da trincheira, para logo lhes cair em cima toda a viril violência do analfabeto de turno.
Não, agora, arriscarão, já não a Mebocaína, mas os isqueiros Dupont, as canetas Mont-Blanc, algum Audizito estacionado lá à porta do jornal, o último modelo de portátil com acesso à net, via último modelo de telemóvel... finalmente, alguma emoção, na coisa. Vidas em risco. Pode-se pedir a algum guionista dos Morangos com Açúcar que lhes escreva o resto.
Claro, talvez seja necessário dar um ou outro retoque, na lei, como fizeram nuestros hermanos, que com a excepção da pena capital, têm hoje uma democrática moldura penal para o chamado "terrorismo" mais pesada agora do que a redigida sob os olhos de lince do próprio generalíssimo Franco. Mas eles que se esforcem, lá no Ministério das Finanças e no da Justiça e no do Interior e no da Economia (que não se sabe se existe ou se é a imagem virtual do ministro), mas não importa. Se não existe arranja-se um.
Claro que Rui Pereira (não este que aqui assina, mas o outro) efectivamente um académico de coturno e não um comentarista semi-analfabeto ligado à câmara de televisão como um paciente de AVC está ligado numa UCI à máquina de desfibrilhação, claro que o professor Rui Pereira que anda com as mãos nestas massas e não é propriamente um democrata da facção ex-maoísta, ex-trotskista, ex-leninista ou de outra facção ex-qualquerista qualquer, o mais certo é não estar pelos ajustes.
Ele sabe que entre a prédica de paróquia acerca do terrorismo e o avolumar das contas na caixa das esmolas dos nossos coristas mediáticos existem directas e voluptuosas relações de coisas tão imateriais como o "dar na televisão" ou tão mais sonantes como um cartãozinho de crédito quase ilimitado onde está escrito "dr. Fulano de tal", num tempo em que para se ser jornalista-cronista neste país pouco mais era preciso do que tirar a 4ª classe para adultos.
Talvez seja, então, melhor mudar de homem. Ou de ministro das Finanças, outra vez. Ou de povo. Ou, então, digo eu, de polvo. Porque este larga uma tal tinta que turva as águas à légua.
Rui Pereira,
jornalista
Trata-se, sob a alcunha de "fiança judicial", da fórmula espanhola para o chamado "imposto revolucionário" que a ETA tinha criado nos idos de 1960 e poucos. Em nome da lei que garante a liberdade de expressão, um indivíduo discursa e a polícia prende-o. Presente ao juiz de instrução do tribunal especial anti-terrorista, em Madrid, são-lhe fixados 250 mil euros de cada vez que lá cai por não ter dito o que a liberdade de expressão manda que todas as pessoas digam. E assim ad eternum...
Claro que isto são chinesices de bascos e espanhóis que, a julgar por alguns letrados cronistas lusos, andam há séculos entretidos a jogar ao gato e ao rato, com aquelas coisas das bombas e das torturas por não terem mais que fazer. Não são gente ocupada como eles, cronistas portugueses, cuja generalidade não tem sequer tempo para gerar uma ideia minimamente atendível. Não são gente como o nosso ministro das Finanças, aflito com a imaginação a acabar-se-lhe para inventar novas formas de extorsão no seu super-wrestling contra o défice, luta de titãs, quem esmagará quem no final?...
Porque, aqui para nós, a verdade é que também nós, nós portugueses em geral, não somos capazes de criar coisas como os bascos, que dão para extorquir dinheiro em nome da lei... tivemos o frágil epifenómeno das FP-25 (quem se lembra?), mas uma coisa assim boa, valente, tributável como uma ETA, vá lá, uma prima dela afastada que fosse, isso não, não temos... não nos está no jeito.
Pois teremos de inventá-la. E a proposta é que o ministro das Finanças passe a dar conferências de imprensa encapuçado, como há uns trinta anos faziam alguns dos mais hiper-demoráticos penas d'ouro da nossa imprensa mais fadista e popularucha. Que seja o Ministério das Finanças a formar a sua própria organização terrorista. Que os juízes trabalhem o Verão inteiro a decretar fianças e mais fianças que vão direitinhas parar ao combate ao défice. Se entre a algaraviada de espanhol que se ouve pela Páscoa e na canícula pelas calles portuguesas houver bascos - dentro também! E fiança! Não esquecer a fiança.
E assim, sim. Os nossos mais destemidos colunistas, fatigados de verberar guerras alheias, de insultar terroristas de outras geografias cujos nomes mal conseguem pronunciar, passam a ter carne fresca. Em vez de se arriscarem apenas a ficar roucos, com os concursos de gritaria que fazem a ver se as vozes lhes chegam ao céu, aplicarão toda a sua verrina contra produto doméstico. Do bom, não são esses filo-terroristas encapotados que às vezes a democracia deixa que ponham a cabeça de fora da trincheira, para logo lhes cair em cima toda a viril violência do analfabeto de turno.
Não, agora, arriscarão, já não a Mebocaína, mas os isqueiros Dupont, as canetas Mont-Blanc, algum Audizito estacionado lá à porta do jornal, o último modelo de portátil com acesso à net, via último modelo de telemóvel... finalmente, alguma emoção, na coisa. Vidas em risco. Pode-se pedir a algum guionista dos Morangos com Açúcar que lhes escreva o resto.
Claro, talvez seja necessário dar um ou outro retoque, na lei, como fizeram nuestros hermanos, que com a excepção da pena capital, têm hoje uma democrática moldura penal para o chamado "terrorismo" mais pesada agora do que a redigida sob os olhos de lince do próprio generalíssimo Franco. Mas eles que se esforcem, lá no Ministério das Finanças e no da Justiça e no do Interior e no da Economia (que não se sabe se existe ou se é a imagem virtual do ministro), mas não importa. Se não existe arranja-se um.
Claro que Rui Pereira (não este que aqui assina, mas o outro) efectivamente um académico de coturno e não um comentarista semi-analfabeto ligado à câmara de televisão como um paciente de AVC está ligado numa UCI à máquina de desfibrilhação, claro que o professor Rui Pereira que anda com as mãos nestas massas e não é propriamente um democrata da facção ex-maoísta, ex-trotskista, ex-leninista ou de outra facção ex-qualquerista qualquer, o mais certo é não estar pelos ajustes.
Ele sabe que entre a prédica de paróquia acerca do terrorismo e o avolumar das contas na caixa das esmolas dos nossos coristas mediáticos existem directas e voluptuosas relações de coisas tão imateriais como o "dar na televisão" ou tão mais sonantes como um cartãozinho de crédito quase ilimitado onde está escrito "dr. Fulano de tal", num tempo em que para se ser jornalista-cronista neste país pouco mais era preciso do que tirar a 4ª classe para adultos.
Talvez seja, então, melhor mudar de homem. Ou de ministro das Finanças, outra vez. Ou de povo. Ou, então, digo eu, de polvo. Porque este larga uma tal tinta que turva as águas à légua.
Rui Pereira,
jornalista
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