Na capa da inominável revista: «O romance que derrotou a ETA»
Já Eduardo
Mendoza começa por dizer que não vive na Catalunha (tal como Aramburu não vive
no País Basco) mas dá-nos uma visão nítida do que se passa nas terras de
Barcelona. É uma perspetiva que é apresentada aos «estrangeiros» como nós, certo.
Mas incomoda a não identificação do fascismo com o franquismo e por assim dizer
ao salazarismo visto ambos serem de matriz católica. Ora, a estrutura do estado
estava assente no fascismo corporativista italiano e segundo Michael Mann o que
diferencia estes dois regimes é a não existência de grupos paramilitares
promotores de terror sobre as massas. Não o seu catolicismo. Sabemos como foram
tratados os radicais de direita nestes regimes. Perseguição em Espanha aos
falangistas e às JONS e, em Portugal, aos «Camisas Azuis» de Rolão Preto, que
criticavam ambos os regimes. Quer Franco, quer Salazar odiavam a desordem. Mas
isso não quer dizer, segundo a minha opinião, que no caso da Catalunha, não
sofresse a repressão do franquismo (que Mendoza e Aramburu aliviam cada um à
sua maneira e na sua região de origem), proibindo a fala do catalão (tal como o
galego e o basco) e cujo desenvolvimento económico levou Espartero a pronunciar
a frase «Há que bombardear Barcelona a cada 50 anos». Isto é fascismo. Os dois
regimes, espanhol e português, souberam como ninguém criar uma sólida cultura
de propaganda e de falso folclore, criando uma espécie de espectáculo
popularucho, inventando trajes, músicas e falsos costumes, estereótipos
franquistas que Mendoza nos apresenta nesta frase: «o catalão é trabalhador, um
pouco lerdo de expressão, bastante tacanho. O seu modo de se comportar é tosco.
A sua imagem é a de um homem barrigudo, de meia-idade, careca, risonho, devoto
de Moreneta, sócio do Barça desde o berço. Comparado com o andaluz gracioso e
preguiçoso, o madrileno jeitoso, o basco algo nobre e duro de moleirinha, o
aragonês teimoso ou o galego astuto, mas impreciso, a caricatura poderia ser
pior». Por isso, não admira que Mendonza nos atire à cara que a burguesia
catalã também não tem literatura e daí a sua derrota frente à intelectualidade
espanhola. A existir, o que é pouco provável, salvai-nos da literatura que
derrota povos inteiros. E de literatos ou poetas em governos!
António Luís Catarino, 13/07/2018