sábado, abril 14, 2012

As insónias e o recurso aos clássicos

Camilo por Vasco
Deve ser da idade. Pelo menos, o Vasco Pulido Valente queixava-se, ainda não há muito tempo, do mesmo. A falta de sono e as insónias que invariavelmente me obrigam a ler. Como os jornais estão como estão (todos iguais uns aos outros e com opiniões de alto coturno, ao nível da mesa de café) e a televisão se encontra insuportável, vejo-me na feliz contingência de me dedicar à releitura de alguns clássicos entre escritores mais ou menos contemporâneos, não vão acusar-me de arrogância. Veio-me às mãos (já o tinha lido em miúdo) A Queda dum Anjo e, palavra de honra, lembrei-me de algumas personagens atuais do nosso parlamento e da nossa opinião política. Aquele Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda não engana: gongórico, redondo, nunca recusando uma citação ilustrativa, é ele o provinciano astuto que se adapta facilmente à conjuntura. E a conjuntura no século XIX era, desgraçadamente, a mesma de hoje. Já o Eça de A Cidade e as Serras (que o Luís Nogueira meu professor de Português nos deu para ler aos 12 anos) mostra uma aparente desprezo por Paris diretamente proporcional ao exagerado amor por Portugal. Não brinques, ó Eça. «Uma maçada! Uma seca!» - não pára de dizer Jacinto para um Zé Fernandes sobre Paris. Não fosse a trigueira Joaninha não querer sair de Tormes e gostaria de adivinhar um outro final. Um final que obrigasse Zé Fernandes a dizer dela o que disse das madames de Jacinto: «- Parece que fala como as mulheres de Camilo! Oh, nunca leste Camilo? Ah o Camilo...» Mortífero. É o que dão as releituras. Obrigam-nos a uma outra forma de entender os livros. Deve ser a idade.