quarta-feira, junho 23, 2010

UM POEMA DE JOSÉ SARAMAGO (1922-2010)


Não me peçam razões...

Não me peçam razões, que não as tenho,
Ou darei quantas queiram: bem sabemos
Que razões são palavras, todas nascem
da mansa hipocrisia que aprendemos.

Não me peçam razões por que se entenda
A força de maré que me enche o peito,
Este estar mal no mundo e nesta lei:
Não fiz a lei e o mundo não aceito.

Não me peçam razões, ou que as desculpe,
Deste modo de amar e destruir:
Quando a noite é de mais é que amanhece
A cor de primavera que há-de vir.

José Saramago, Os Poemas Possíveis
 
[poema distribuído na sessão de autógrafos de Conto de Travessa das Musas, 20.06.2010]