segunda-feira, outubro 26, 2009

Reis-Sá e a insolvência da Quasi

Reis-Sá
Soube há pouco da insolvência da Quasi. A notícia, em si, choca. Primeiro, porque se trata de uma editora que defendeu a poesia e, com ela, a defesa da edição de poesia e de novos autores. Segundo, porque Reis-Sá, que conheço mal (estive com ele umas duas vezes nas Correntes d'Escritas, outra, de passagem nas Quintas de Leitura e trocámos, ainda, uns mails) é, inquestionavelmente, um editor que tem critérios de edição, ou seja, não edita de tudo o que lhe aparece (acreditem que as propostas são aos milhares!). Terceiro, porque não sendo eu um indivíduo muito dado às contas e à gestão, reconheço que os números que me dão todos os meses para análise são péssimos. Ninguém, portanto, me venha com a tão falada «crise» porque, tal como Reis-Sá, só conheci o mundo editorial (ou lá o que isso é) em continuada «crise». Nunca o conheci sem ser em «crise». Portanto, serei o último a falar de gestão e de números. Reconheço que a Deriva é também gerida por outros que não eu e, ao mesmo tempo, dou incomensurável valor a quem estica daqui e dali o dinheiro de uma editora que não dá para tudo. Por vezes, sinto que seria mais fácil fechar as portas para quem não ganha nada com isto.

Mas virem agora dizer da má gestão de Reis-Sá é um exercício de um cinismo só visto neste país pequenito, feito de gente pequenita e de comentários pequenitos. Reis-Sá geriu mal? Agora sim, mas antes era o editor que editava os «nossos» livros, o tipo que ficava com os lucros da «nossa» obra, o gestor de génios mal-compreendidos, de «poetas» livres, de «escritores» mais mal-ditos que malditos, o empreendedor que fazia, sem rebuços, parcerias com Câmaras e Fundações! Como se isso fosse pecado ou corrupção! Nós, na Deriva, fazêmo-las e temos pena de não fazer mais.

Pois bem, num país em que os leitores habituais de poesia, não são mais que duzentos (quando não são menos!), em que há mais poetas que leitores de poesia; num país onde as pessoas estão sempre à espera que lhe ofereçam um livro, em vez de o comprarem nas livrarias; onde ninguém se indigna porque os grandes espaços já não vendem poesia (preferem que a esquisita, ou esquisito, que vai comprar esse «género» encomende o livro); onde as bibliotecas não compram nem poesia ou prosa contemporâneas; onde é naturalíssimo os professores mendigarem livros de borla, ou gentilmente oferecidos, às bibliotecas da escola; onde ninguém ensina poesia ou literatura dos novos autores porque não têm pachorra para utilizar fichas de exploração elaboradas por si, esperando pelos livros da Texto e Porto Editora; num país onde os editores quase dão mais livros aos críticos do que existem de leitores, para depois nem falarem deles sequer ou perderem-nos nas redacções... Num país pequenito onde se utiliza a Internet para dizer mal de quem faz e de quem apoia os novos autores, às vezes por invejas mesquinhas e esperando ansiosamente pela queda do tal «editor/explorador», obrigando-nos muitas vezes à queixa pública, vêm agora os mais desenvergonhados lamentar a insolvência da Quasi, quando já perspectivam outras falências a seguir. Basta ler os comentários editados na blogosfera para não deixar de sentir uma sensação de nojo.

Quanto a Reis-Sá, penso que fez o que tinha a fazer na Quasi. Tentou que desse resultado. Mas num país pequenito é assim que as coisas se dão. A obra ficará aí e o seu papel como editor, também. Depois, logo se verá sobre os outros que vegetam pacientemente até um lugar nos governos ou numa qualquer curadoria. País este...