É um princípio meu desde que escrevo aqui e faço as minhas fichas de leitura que divulgo posteriormente no facebook não referir os livros de que não gosto. Adoptei esse critério e sinceramente tenho-me dado bem com ele. Mas há limites. E um deles foi um determinado livro que me veio parar às mãos. Não digo o nome da autora, nem o título da «obra». A editora é a BookBuilders que qualquer um pode editar, deduzindo que o «autor» paga antecipadamente a edição (o que não deve ser pouco). Imitando claramente as capas de outras editoras, o livro tem o mesmo estatuto, pelo menos nas estantes, de outras editoras ditas sérias ou, pelo menos, que procuram critérios mínimos de qualidade.
Não consegui ler o livro até ao fim. Deixo-vos alguns trechos. Isto pode levar-vos à acusação de descontextualização, mas acreditem que a contextualização é uma experiência muito pior, visto a qualidade é mais que sofrível. Partilhem comigo estes nacos:
A c*** da Aninhas:
«O Machado do primeiro direito sonhava muitas vezes com a c*** da Aninhas. De todas as c**** que conhecera na vida, a da Aninhas, talvez pela cor, um vermelho alanrajado a fazer lembrar as coralinas que cresciam no quintal dos seus avós galegos, e também pela extraordinária capacidade de se expandir, era a que recordava com mais saudades (...)». Não conto mais. Havia um colega meu no liceu, completamente tarado sexual, que descreveria melhor a genitália feminina do que a sua comparação com uma couve!
Os ciganos:
«Os ciganos são pontuais e exibem uma sofisticação vaidosa, camisas de cores florais, calças justas, mocassins de pele falsa, cabelos penteados com gel. Compram cigarros, batatas fritas, as tabletes de chocolate mais caras. Nunca respeitam a fila que se forma para pagamento dos produtos da loja. Olham com superioridade os restantes clientes da bomba de gasolina, ninguém se atreve a chamá-los à atenção.» Não se compreende o facto de comprarem as tabletes de chocolate mais caras. Isso é que não!
Os deficientes:
«Há também o casal que tem o filho deficiente. Não é maluquinho como o maluquinho das rotundas, é apenas um pouco atrasado. Habitualmente sentam-se na mesa junto do escaparate com os livrinhos da fundação. (...) [o rapaz] bate palmas [diante de um pastel de nata], saboreia com gosto, fica à espera de mais. Como um cão que aguarda os restos da refeição do dono.»
O racismo:
«O primeiro [amante da Aninhas] chamava-se Augusto. Pintava paisagens marítimas e plantava chalotas, favas e ervilhas numa horta comunitária na colina de Chelas. Era um preto grande, descendente de Gungunhana, mas tinha uma pila muito pequena. Aninhas mal dava por ela.»
A Zona J:
«Quando estava em baixo, quando, no trabalho, não aguentava as lágrimas, quando só queria morrer e vocês já eram nascidos [os 3 filhos da «autora»], metia-me no carro e vinha até aqui, fazia o caminho num choro que me libertava. Depois observava as crianças do bairro, os velhos desdentados, as mulheres feias, e, sentindo a minha própria maldade, sossegava.» Eu diria como um cão que recebe a comida do dono!
O ódio aos subordinados:
«Ao princípio Aninhas [todas as personagens se chamam Aninhas o que é uma inovação literária de truz!] sentiu-se embaraçada por ter quem trabalhasse sob a sua supervisão. Nunca mandara em quem quer que fosse. Descendia de uma linha de antepassados assalariados, a pobreza vinha de longe, uma genealogia de trabalho mal pago. como podia quebrar essa linhagem de servilismo? Que autoridade tinha para se fazer obedecer? A estranheza foi passageira. Quando a empregada tocou à campainha pela manhã, Aninhas sentiu uma alegria semelhante à de uma criança que se prepara para brincar ao faz de conta. (...) Preparava-se pela primeira vez na vida de mandar!» Ah! Lá se foi a genealogia do servilismo!
O passeio pela Almirante Reis contra a ralé do piorio:
«Depois, confesso, há outta coisa que me conforta. O João Pedro é completamente normal. Eu também. Quando passamos pela avenida toda a gente nos olha. Somos um par insólito. Roubamos o protagonismo das putas, dos bêbados, dos chulos, dos travestis e dos heroinómanos. E isso enche-me de orgulho.» Continua normal, Aninhas, tu e o João Pedro. Fazem um belo par de anormais completamente normais!
O amor pelas crianças loiras:
«Quando nasceu o primeiro filho houve logo quem duvidasse da sua fidelidade ao marido. É que o marido era ainda mais feio do que ela. Como podia aquela mulher dar à luz uma criança de cachos loiros, com a pele pálida, acetinada, macia, os olhos claros, a fazer lembrar a abóbada celeste nas tardes de Verão? O filho não podia ser seu marido.»
Não consegui ler mais que as primeiras 55 páginas de 200 que são o que são por este breve passeio do que se faz de melhor na «literatura» chegana. A «autora» diz-se jurista.