Os destinos de Portugal e Catalunha estiveram quase sempre
cruzados. Os reis fundadores da 1ª dinastia portuguesa eram de origem
borgonhesa e eram conhecidas as preferências por casamentos fora do âmbito de
Castela. Desde Afonso Henriques, primeiro de Portugal, que se casou com Mafalda,
da casa de Saboia, até D. Dinis que se enlaçou com uma princesa de Aragão,
Isabel, como forma de não colocar em perigo a sucessão para mãos imperiais. Não
será igualmente necessário, creio, lembrar os contributos catalães para a
expansão afro-indo-americana dos portugueses, nomeadamente os dos célebres
mapas (muito completos para a altura) dos geógrafos judeus dos condados de
Barcelona. Mas foi em 1640 que a História juntou os dois povos. Lembremos em
que consistiu o 1º de dezembro desse ano, ainda hoje feriado nacional por cá:
em 1637 houve uma séria revolta popular contra o governo espanhol da União
Ibérica de Filipe IV (o «nosso» Filipe III) devido a um brutal aumento de
impostos e a repressão violenta que se seguiu. A grande burguesia mercantil, a
alta nobreza e o alto clero, que tinham apoiado avidamente a União com Espanha,
sentem-se ameaçadas pelas revoltas e antecipam um golpe de estado no dia 1 de
dezembro de 1640 declarando a restauração da independência portuguesa. Ora, é
exatamente na mesma ocasião que a Catalunha se revolta contra a presença
espanhola originando a Guerra dos Segadores que vai de 1640 a 1652, sem que,
historicamente, se prove qualquer ligação entre os revoltosos de ambos os
campos. A História também é feita de coincidências! A hesitação filipina faz
com que Portugal, exangue e sem exército ou marinha dignos desse nome, se
refaça com tempo e espaço e a sempre eterna «ajuda» britânica. Mais tarde,
levámos com oito invasões que tentaram repor a União Ibérica dos Habsburgos,
todas elas sem um vencedor declarado. Isto até 1666, quando se deu a paz.
Perante a proximidade do referendo catalão de 1 de outubro de 2017 (igualmente
a data das nossas eleições autárquicas!), não se entende a posição de grande
parte dos «opinadores» portugueses face à eventual independência catalã: a
maior parte cala-se e não toma partido e, quando o faz, insulta os catalães com
artigos penosos como «A Vergonha da Catalunha» de Henrique Monteiro, (Expresso, 8/09/17) ou,
pior, resume-se a questionar se é bom para a economia caseira, devido ao peso
de Barcelona no PIB espanhol. Outros desdenham o processo, lembrando a Escócia,
Sérvia, Croácia, Eslováquia, Eslovénia ou o Kosovo, como se houvesse comparação
de realidades tão diferentes. Maior cinismo não há quando, a existir uma
comparação óbvia, essa seria a da Catalunha com outro país: Portugal.
António Luís Catarino, 8/8/2017