terça-feira, abril 05, 2022

« O Logro da Arte Contemporânea », Gianfranco Sanguinetti

 

Barco Bêbado, 2022
Gianfranco Sanguinetti, activista e pensador situacionista foi já publicado em Portugal, pela Antígona que publicou o oportuno (estávamos a sair dos anos de chumbo na Europa) «Do terrorismo e do estado» e pelos seus textos na revista da IS dispersos e co-assinados com Debord, entre outros. 

Aliás, o que faz um livro útil é exactamente a sua oportunidade e este livrinho da Barco Bêbado cumpre esse papel. «O Logro da Arte Contemporânea» foi publicado originalmente em Abril de 2021, na Itália e o título que lhe deu forma diz ao que vem. Com base nas teorias sobre arte e de um panfleto de Pablo Echaurren que denuncia a arte contemporânea como mero produto mercantil (D-M-D) em que D é o dinheiro e M, mercadoria, Sanguinetti define esse mesmo logro como um «fazer crer aos contemporâneos que a arte é aquilo que hoje se vem apresentando enquanto tal.» e continua: «E, como a contemporaneidade dá, e tem dado, repetidas vezes, prova de ser essencialmente uma tola crédula, além de ignorante, pode pôr-se-lhe à mesa, todos os dias, mil alimentos falsificados, rotulados como ''arte'', de que ela se alimentará sem nunca protestar, assim como não protesta contra a neo-comida que se vende em todos os supermercados.»

Para os urbanistas entusiastas das cidades modernas, Sanguinetti dedica-lhes um pequeno capítulo «A Cidade infeliz» onde vê magnetizada essa enorme infelicidade quer nos transportes públicos, quer na taxa de suicídios que sobe cada vez mais e avisadamente escondida; nessas cidades infelizes cresce a violência, a corrupção, a proibição contínua sobre o indivíduo e as liberdades. O autor questiona o que faz a arte sobre isto: «Sobretudo, dá a impressão de [a arte] não querer correr riscos; torna-se assim numa presença que se quer tranquilizadora: tem medo de meter medo. (...) Contenta-se em ser uma arte triste e vil, como de facto é: é, pois, normal que seja infundida daquilo a que Espinosa chamava as paixões tristes, como a do dinheiro.»

Em «Felizes Excepções» e depois de nos apresentar algumas experiências alternativas e de rejeição ao estado e à arte «conceptual» (Sanguinetti, atrás explica como aparece esta noção de conceito ligada à arte, o que é mais um logro), levanta o véu de uma verdadeira arte de revolta de insubmissão ao mesmo tempo que nos apresenta alternativas a seguir: «(...)Estes artistas de facto criam situações conflituantes, provocatórias e verdadeiramente escandalosas, que põem à prova as contradições do espectáculo, a frigidez e a imunidade do público, a solidez das instituições, com a crueldade do détournement pós-situacionista, a impostura subs«versiva, a usurpação da identidade e das prerrogativas do poder, e de uma centena de outros modos.»

Não deixem escapar este livro até por que a sua tiragem é de somente 300 exemplares. Pode adquirir-se pela Livraria Snob, como eu fiz.
A tradução é de Ana Isabel Soares.