Puro exercício de estilo aplicado para a noite de 24 de abril: saia de casa devagarinho, com máscara e luvas. Não leve o cão porque pode ser identificado. Mas não se esqueça de uma sweatshirt e cubra a cabeça com o capuz, porque está frio e pode até chover. Olhe para cima e identifique os andares dos prédios com panos pretos. Não, não são anarquistas. São fascistas que os mostram e já não têm vergonha. Muna-se de uma pequena fisga que usa na pesca para atirar longe o engodo aos peixes. Em vez do engodo, use as esferas de metal ou carretos de uma bicicleta velha, mas podem ser também pequenas pedras. Agora, com o covid19 ninguém desconfia. Pode igualmente levar uma pressão de ar, mas não se jura que os efeitos serão tão graves como a fisga e pode gerar interrogações evitáveis. Aponte bem e atire. Ouvirá um estilhaçar de um vidro. Boa. Inicie a sua rusga pelo fim do cotovelo da rua e não pelo princípio. A fuga será então possível, sem grandes problemas ou perturbações inesperadas. No fundo, estarão quase todos em casa a ouvir a Grândola. Não se assuste. Isto é só imaginação minha. Um exercício sem qualquer consequência de maior. Porque se o fizer pode correr o risco de encontrar a felicidade que acompanha a transgressão e a revolta. Bom 25A!
António Luís Catarino
Coimbra, 21 de abril de 2020