Versos para Adormecer
Ontem, para adormecer, embalei-me
nos versos que acontecem antes
de adormecer, quando o sono já manda
e o corpo não obedece à ordem
de acender a luz e procurar papel
e caneta. Antes de adormecer escrevi
os versos que escrevo agora, à secretária,
numa pausa apressada, para combater
o stress com desactualizada ortografia. E lembro-me
que voltei a pensar neles de manhã, na sonolência
do autocarro, ao chegar ao terminal. O corpo
vinha então aos versos, a despropósito,
estava parado a ser. De manhã,
à entrada de Lisboa, os versos são por vezes coisas
que coloco em paralelo ao rio.
Apócrifo, José Ricardo Nunes, Deriva, 2007