Hugo Neto, Setúbal. 2013 |
Lisboa, Março,
2008
Folha
de rosto
Reparo
na cara de um velho e admiro, com reverência,
a
trajectória afirmativa das rugas, a audácia da água calejada na vista.
Na
minha vincaram-se também linhas irreparáveis de um passado,
em
debate com a pele ainda lisa, à espera de outras dobras.
Mas
numa cara tão visitada por máscaras várias – a do velho,
da
mulher, da criança, do feliz, do triste, do excluido,
do
passional, do criminoso, do morto, do fugitivo…– furto-me
a
decidir que feição tenha esboçado predominância;
que
tipo de homem sou.
Algo,
porém, predominou. Após cada máscara voltou sempre
a
pausa de uma interrogação, a amargura duma expectativa;
lisa
máscara da ausência. Somente
incriminada
por dois olhos a tremerem numa água enverdecida,
que
ora diz é já tarde, ora diz é possível;
é já tarde, é possível; é já tarde, é
possível; é já tarde? É bem possível.
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