terça-feira, junho 14, 2022

«História de quem vai e de quem fica», Elena Ferrante, vol.III

 

«Na fábrica - percebera logo isso - a grande fadiga fazia com que as pessoas desejassem foder, mas não com a mulher ou com o maridos nas suas casas, onde regressavam extenuadas e sem desejo, mas ali, no trabalho, de manhã, ou de tarde. Os homens davam apalpões sempre que tiham oportunidade, faziam propostas ao passar; e as mulheres, sobretudo as menos jovens, riam-se, roçavam neles o peito grande, apaixonavam-se, e o amor tornava-se uma diversão que atenuava o cansaço e o tédio, dava uma impressão de verdadeira vida.» (pág.82)

Os Anos de Chumbo:
«Ah, sim, antifascismo militante, nova resistência, justiça proletária, e outras fórmulas a que ela, que por instinto sabia esquivar-se à cassete do partido, era sem dúvida capaz de dar consistência. Imaginei que aquelas acções fossem obrigatórias para entrar, sei lá, nas Brigadas Vermelhas, na Primeira Linha, nos Núcleos Armados Proletários. Lila desapareceria do bairro como já fizera Pasquale. Talvez fosse por isso que tentara entregar-me Gennaro, aparentemente por um mês, mas na realidade com a intenção de mo dar para sempre. Nunca mais a veríamos. Ou seria presa, como acontecera aos cabecilhas das Brigadas Vermelhas , Curcio e Fransceschini. Ou escaparia a todos os polícias e à prisão, fantasiosa e temerária como era. E quando a cosa grande se realizasse, ela reapareceria triunfante, pelas suas proezas, com indumentária de chefe revolucionário, e dir-me-ia: tu querias escrever romances, eu fiz o romance, com pessoas de verdade, com sangue de verdade, na realidade.» (pág.243)