sexta-feira, novembro 30, 2018

1961 – O annus horribilis de Salazar 8


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56 anos não constitui nenhum número redondo, daqueles que são lembrados porfiadamente pelos anais da História. Por isso mesmo, vou lembrá-lo. 1961, foi o início do fim do Império português. Ainda hoje, perguntamo-nos como aguentou Salazar na cadeira do poder, num ano que tinha tudo contra ele. E não é nenhuma metáfora maldosa, visto que foi a queda numa cadeira que, literalmente, o levou à morte. Neste ano, em fevereiro, deu-se início à guerra colonial em Angola que se transmitiu rapidamente a Moçambique e à Guiné-Bissau e Cabo Verde. Foram três frentes de guerra que obrigaram à morte, durante 13 longos anos, de dezenas de milhar de vítimas. Em janeiro, Henrique Galvão e um comando luso-espanhol, desviou o paquete Santa Maria para o Brasil, tendo o governo brasileiro acolhido os «piratas» pró-liberdade como exilados políticos. Em abril, o General Botelho Moniz tenta um golpe de Estado palaciano para retirar o poder a Salazar. A extrema da extrema-direita impediu-o de levar a cabo esta tentativa. Mas a coisa deu frutos. Meses depois, dá-se o ataque do coronel Varela Gomes ao Quartel de Beja, para que se iniciasse um levantamento militar geral. Mal preparado e mal planificado, o golpe morreu ali. Em novembro, um avião da TAP é desviado por Palma Inácio que mais tarde funda um movimento armado – a LUAR. Portugal é, sem dúvida, um pioneiro nos desvios de paquetes e aviões. Em dezembro, dá-se a fuga da prisão política de Caxias, de Álvaro Cunhal e de mais nove camaradas seus do PCP, num carro blindado de…Salazar! Aliás, este partido aumenta os protestos de rua. É ainda em 1961, que Nerhu, da União Indiana, anexa Goa, Damão e Diu, enclaves, até aí, portugueses. É evidente que Salazar tinha tudo para ficar no poder. Ele era um ditador. Portanto, ditava. Reprimia. Tinha tudo para continuar. Que democrata conseguiria, hoje, suster-se assim? Ora, é aqui que me interrogo. Na época da pós-verdade inaugurada por Trump, bastava twittar alegremente, semana sim, semana não, uma espécie de «bad news» desculpabilizantes. «Portugal is attacked by bad guys», «I will build a wall in the Atlantic!» etc. Mas o velho ditador, astuto, sabia o que o esperava: em 1962, em plena contestação académica, perguntou ao então reitor da universidade de Lisboa, Marcello Caetano, se tinha dialogado com os estudantes. Este, mentindo, disse-lhe que não. Responde-lhe Salazar: «Ah, ainda bem, por que se o fizesse, daqui a 10 anos, eram eles que aqui estavam!». Errou por dois anos!

António Luís Catarino, 12/06/2017