Das Indústrias Culturais
As principais cidades portuguesas estão
gentrificadas, ou seja, turistificadas. Quando olhamos, hoje, para o
Porto e Lisboa, vimos uma massa de turistas, geralmente em grupo, que
passeiam, por vezes à pressa, pelas suas ruas. O debate está em
aberto na sociedade portuguesa e nas suas instituições políticas.
Estas últimas tentam desdenhar o problema, porque de um problema se
trata. O dinheiro não é despiciendo para os impostos e já se fala
em impor ao Porto uma taxa turística de dois euros por cada dia que
um turista passa na cidade. Em Lisboa basta um único euro que
reverterá, dizem, para a recuperação do património nacional. O
problema para a sociedade civil é outro. Os centros esvaziam-se das
suas populações sendo substituídos por hostels e comércio
de duvidosa qualidade e as chamadas indústrias culturais
multiplicam-se. São os museus e a cultura que servem de «menu» aos
turistas. Mas cuidado, gente boa que nos vem visitar! No Porto, o
Museu de Serralves tem abandonado devagarinho os seus objectivos
primordiais de expor a sua colecção per
manente, para nos dar
pintura e instalações de gosto duvidoso. A própria mostra das 80
obras de Miró, que o Estado se apropriou, quando da falência do
Banco Espírito Santo, não têm qualquer coerência quer
cronológica, quer conceptual. São quadros «a monte» comprados por
especuladores e que nem a boa vontade do seu curador, Siza Vieira,
conseguiu dar-lhe a tal coerência expositiva que lhe falta. As
Indústria culturais de grandes empresas multiplicam-se para dar
conta do aumento de turismo. É o MAAT um museu de arte contemporânea
ligado à EDP (empresa de electricidade ligada a capitais chineses),
o Museu Joe Berardo (outro banqueiro falido) que mais não é um
amontoado de obras compradas avulso e espectáculos teatrais, de moda
e musicais que se desdobram para gosto dos «turistas». Claro que há
quem resista e tente expor e trabalhar com base numa escolha
artística séria como, por exemplo, a exposição de Amadeo de
Souza-Cardozo ou de Almada Negreiros esse «futurista e tudo», mas
são efémeras e repartem-se rapidamente entre as duas cidades mais
importantes de Portugal. As indústrias culturais estão aí para dar
e vender. Literalmente. Mudam as populações originárias dos
centros urbanos, aumenta-se o preço numa gastronomia que pouco tem
de autóctone, o barulho de DJ’s nas ruas retira-nos o silêncio
necessário da cidade, as árvores são arrancadas para alargar os
passeios das ruas. Só me resta um apelo, a vós, turistas:
salvem-nos das indústrias culturais. Exijam genuinidade!
António Luís Catarino
Publicado em 14 03 2017
Suplemento Cultural Taboa Redonda do El
Progreso e Diario de Pontevedra