sábado, abril 28, 2018

Almada Negreiros! 2

José de Almada Negreiros

O ponto de exclamação aposto neste título tem tudo a ver com a postura guerreira do poeta, dramaturgo, encenador, contista, pintor e desenhador modernista. Português, «futurista e tudo!», segundo as suas palavras iniciais, foi um verdadeiro tufão, um ciclone, no calmo e obediente panorama das letras e artes pictóricas portuguesas do início do século. Nascido na ilha de S. Tomé em 1893, faleceu em 1970 em Lisboa. Revejo-o, hoje, como um fenómeno ímpar e não repetido na arte portuguesa. Mas não se iludam com os rótulos com que errada e frequentemente se lhe colam à pele. O seu espírito irrequieto e independente recusaria qualquer compartimento artístico ou movimento que lhe roubaria a sua individualidade singular. Foi precoce em tudo e recusou qualquer educação artística. Ligou-se à revista Orpheu juntamente com Fernando Pessoa/Álvaro de Campos, Mário de Sá-Carneiro ou José Pacheko. A revista Portugal Futurista, apreendida pela polícia logo no seu primeiro número, juntou-o a Amadeo de Souza-Cardozo e Santa-Rita Pintor, falecidos, muito novos, em 1918. Mário de Sá-Carneiro tinha-se suicidado em Paris logo em 1916. O circunspecto e introvertido Fernando Pessoa, dizia-se, não simpatizaria muito com a irrequietude e o hiperactivismo de Almada, mas nunca pôs em causa a sua genialidade. Porque de um génio se tratava. Não se deixava amansar. O facto de ter passado por Paris e por Madrid, juntamente com Sarah Afonso, sua companheira e artista excepcional, não travou o seu encanto crítico a Portugal. Veio para cá. O seu carácter intransigente para com movimentos artísticos levou-o, mais tarde, a recusar ser futurista, nomeando-se interseccionista e sensacionista e chegando a boicotar uma palestra de Marinetti em Lisboa, no ano de 1932, que, descuidado, se juntou a Júlio Dantas ou ao autor da autoritária «Política de Espírito» de António Ferro, e ao que de mais retrógrado se fazia em Portugal. Não conseguiu juntar poetas ou pintores multiplicando-se em revistas efémeras. Abominava a prosápia e a genuflexão política. Como ele disse no seu Manifesto Anti-Dantas «Basta PUM Basta! Uma geração, que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi! É um coio d’indigentes, d’indignos e de cegos! É uma rêsma de charlatães e de vendidos, e só pode parir abaixo de zero! Abaixo a geração! Morra o Dantas, morra! PIM!». Olhamos, hoje, à nossa volta, e resta-nos proclamar, algo desconsolados: Almada!

António Luís Catarino
29 março de 2017