sábado, abril 02, 2022

«Pirilampos», Ricardo Gil Soeiro

 


Tive a sorte de ter editado, na Deriva, Bartlebys Reunidos e Palimpsesto com Ricardo Gil Soeiro. Para além da amizade e a rápida empatia que senti como pessoa, percebemos, todos os que o leram, que se tratava de um poeta sólido, coerente e de uma enorme imaginação poética. Um cultor rigoroso da palavra e da emoção. O futuro vai dar razão aos que o vêem como um dos maiores poetas desta geração. Hoje, dia 2, em Lisboa, na Tantos Livros, pelas 17:00, vai ser a apresentação de «Pirilampos», o seu último livro com a chancela da Assírio. Grande contentamento, embora e infelizmente não possa estar presente. Mas convido-os a conhecerem-no.

O livro, esse já o tenho. Corri a comprá-lo e maravilhei-me com ele, como quando era um puto que, junto com o avô, no Verão e em Coimbra, ia para a Arregaça à noite procurar pirilampos. Trazia um ou dois para casa num copo e deixava-os na mesa de cabeceira da minha cama. No dia seguinte o meu avô libertava-os logo de manhã. Havia uma qualquer magia nesses insectos luminosos e que são percebidos nesta obra do Ricardo Gil, continuando com a sua prática palimpséstica de reescrita inovadora e estranha. Mas inteiramente maravilhosa. Hoje já não se encontram facilmente pirilampos e a sua leve alegoria à morte e à vida breve e inútil que temos assumem uma importância grande na leitura que fazemos dos seus poemas. 

«De mim só me lembro
de um segredo tuvo, 
sem culpa e sem enredos,
no poço sombrio da infância.
Suponho que existir é isto:
sucumbir, impiedosamente,
ao musgo podre da memória.
O lago deixando adivinhar o zumbido
de insectos que disputam, sem saberem,
o mudo brilho das estrelas.
(...)»
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