segunda-feira, outubro 04, 2021

Penúltimo Outono (2)

Estava determinado. Não sei bem em quê, mas estava determinado. Na Clepsidra encontrava-me com os meus companheiros de luta, os imprescindíveis de que falava Brecht. Tínhamos tarefas no andar de cima que subíamos seriíssimos para ir para o policopiador e abrir o stencil azul, mais a tinta preta necessária e as resmas de papel branco, por vezes azul. Assinávamos como Cpael, acrónimo difícil de verbalizar, mas éramos já conhecidos pela malta do liceu. E provavelmente de outros liceus, porque alguns companheiros menos auspiciosos dos futuros radiosos pediam-nos para irmos lá nós que já estávamos mais «queimados» do que eles, virgens sedutoras da mole liceal por esclarecer gajo por gajo. Para isso estavam lá eles. Cheirou-nos a cobardia, mas as coisas são o que são e a mente humana já nos estava dissecada pelas leituras de Tolstoi, Dostoievsky, Roger Vailland, Aragon, Cholokov e o grande Gorki! Nada de novo, portanto. Tínhamos era de ter cuidado com as unhas. O negro da tinta do stencil entranhado nas unhas podia deitar tudo a perder e a pide sabia abrir-nos as mãos. Havia uma escala: unhas pretas significavam elaboração de stencil e comunicados, coisa não tão grave; já as pontas dos dedos, unhas e palma das mãos pretas era mais grave e significava sem dúvida pichagens nas paredes. (...)