quinta-feira, dezembro 10, 2020

Lenine e Nós, de Boaventura de Sousa Santos



O facto de Boaventura de Sousa Santos escrever sobre Lenine, já por si, é uma notícia. Mais notícia será se nos ativermos às posições políticas do sociólogo que está longe de estar em consonância com o PCP. Tal como disse há uns tempos por aqui, o BE irá ser penalizado pela posição que tomou relativamente ao fim da negociação na especialidade do Orçamento para 2021 com o Governo, votando contra. Sei que alguns companheiros do BE estão zangados com as medidas do PS e do Governo no campo do trabalho, da precariedade e da saúde que não são uma novidade, nem apontam para uma flexão (mais) à direita. Porque já estariam nos orçamentos anteriores que foram votados com abstenções da esquerda parlamentar. Qual, então, a importância deste artigo de BSS? É que a sua análise à posição do Bloco vem de encontro ao que já aqui dissemos repetidamente sobre o seu vazio ideológico muito mais permeável a incompreensões sociológicas e erros políticos, que o impedem de uma compreensão global sobre o querer e a sensibilidade políticas do «povo de esquerda». Apresentar um artigo desta importância tendo como base «O Esquerdismo doença infantil do Comunismo», de Lenine, nem em sonhos eu era capaz de o pensar e muito menos de o fazer (então aqui, no FB!). Mas Boaventura fá-lo com a elegância e a síntese que lhe são atribuídas por muitos. Outros, também muitos, nunca o diriam assim. Não tenho para mim que o BE seja esquerdista e, segundo compreendo, nem BSS o acha, senão entraria em contradição com a acusação de vazio ideológico do BE. A análise recai sobre a estratégia do BE e do PCP que apoiaram a Geringonça. Estratégias díspares, mas valorizando a do PCP. A análise vale por isso mesmo. O ataque concertado ao PCP também é visto como parte integrante da estratégia da direita que absorve as críticas ao Governo pela esquerda. A direita sabe muito bem o que faz. E, prova disso mesmo é que logo após a publicação deste artigo, o ataque de toda a direita se faz a BSS por causa da chamada de Lenine à colação. Compreende-se a proscrição do revolucionário russo por antinomia, mas é inegável o apoio implícito ou explícito de largas franjas da esquerda a esta figura que Boaventura corajosamente foi chamar. Um texto a ler e a (re)pensar. Antes que a direita e a extrema-direita toquem as trombetas do triunfo.

O artigo de Boaventura de Sousa Santos é este:

https://www.publico.pt/2020/12/07/opiniao/opiniao/lenine-1941149?fbclid=IwAR10lSJtdmscoOUXd0csPWUwz5elHQ_MNnu9RRVQKyG46dj10S-0PRk0Lfw

António Luís Catarino

7 de Dezembro de 2020