domingo, dezembro 30, 2012

O Pensamento Tornado Dança, Estudos em torno de George Steiner, org. por Ricardo Gil Soeiro


Primeiro estranha-se, depois, entranha-se. Um livro sobre George Steiner, editado pelo Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e organizado por Ricardo Gil Soeiro. Li  somente a comunicação de Vasco Graça Moura e de João Lobo Antunes. Preparo-me para ler o resto ainda hoje com participações extremamente interessantes para o conhecimento de Steiner. Ver aqui.Guardo para vocês, e sobre a Educação, tão importante para este filósofo, trechos sobre a comunicação de João Lobo Antunes que deixo à consideração e reflexão de todos:
«Uma das teses fundamentais é a de que a educação exige o culto de valores de dificuldade, e repete a citação de Spinoza, que tudo o que é excelente é raro e difícil. No ensaio ''Elogio da Dificuldade'', chamei a atenção para o facto de que o que se pede hoje ao ensino não é muito diferente do que se exige na aquisição de um bem de consumo - automóvel, a parelho de vídeo, computador - ou seja, quer-se barato, de boa qualidade e ''amigo do utilizador''. Mas, de facto,  a missão da educação não é primariamente fazer com que os estudantes se sintam felizes na escola, como afirmava Woodrow Wilson, presidente de Princeton, antes de se transferir para a Casa Branca. A educação deve, sim, fornecer instrumentos de felicidade, e esta é necessariamente uma construção pessoal, para a qual a escola pode contribuir dando músculo às qualidades de espírito e de carácter indispensáveis à jornada.
Se é verdade que a escola fácil não cumpre a missão de preparar para a vida difícil e se, como nota Steiner, a simplificação, o nivelamento por baixo, a ''diluição'', são autênticos crimes, há infelizmente entre nós a tendência para criar a dificuldade espúria, gratuita, como por exemplo pela mudança imprevisível das regras do jogo, pelo currículo empanturrado, pela mesquinhez do pormenor inútil, da pergunta matreira ou pela distância soberba que nega o mandato sagrado de ensinar.
A escola fácil a que me refiro é a que cede à demagógica satisfação dos caprichos, a que fecha os olhos à burla científica, à incompetência de mestres e alunos, que se submete ao relativismo que nega o mérito individual, que procura o consenso que nivela pelo menor denominador, que entende que os valores se não distinguem, e aceita, como dizia Séneca, que os vícios se transformem em costumes.
Steiner quer expulsar os vendilhões do templo, aqueles professores que ele chama ''assassinos da esperança e da perfectibilidade dos jovens'', aqueles que reduzem as matérias a uma ''inanidade cinzenta'', que vão deixando cair gota a gota o mais corrosivo dos ácidos - o enfado.
Segundo Steiner, para ensinar é preciso ser um ''doador, ser um pouco louco, estar nu e não ter vergonha da sua nudez'' e, como diz noutro escrito, ser afligido por uma doença crónica: a doença do optimismo.»
João Lobo Antunes, Lições de George Steiner,O Pensamento Tornado Dança, Lisboa, Roma Ed. 2009