sábado, abril 28, 2012

Claúdia Sousa Dias sobre "A inexistência de Eva" de Filipa Leal




Filipa Leal, poeta, jornalista e, actualmente, colaboradora no programa “Câmara Clara”, dá-nos uma poesia minimalista mas na qual está contida uma densíssima massa de ingredientes emocionais. Trata-se de uma poética que fala do medo da perda, das palavras que ficam por dizer, submersas na brancura imaculada de um mundo onde só a perfeição tem lugar. As coisas importantes mas desestabilizadoras vindas do mundo “lá fora” estão cuidadosamente embutidas nas entrelinhas, apagadas pela aparente perfeição de um paraíso, belo, sem mácula mas fortemente murado. Como tal, o leitor vê-se compelido a descodificar as mensagens subliminares, cifradas, actividade que torna a leitura muito mais exigente e absorvente, permitindo demarcar a escrita desta jovem poeta da escrita banal.

Eva ou Lillith?

A obra A Inexistência de Eva, dá voz à alma de uma mulher aparentemente submissa mas dotada de uma inquietude interior, que poderá ter de pagar o preço da solidão e da incerteza para preservar a identidade.
Ligada a esta “Eva” de Filipa Leal, está também a simbologia da maçã, directamente relacionada com o livro do Génesis. A Maçã representa o Conhecimento. Conhecimento que é uma forma de Poder. E o desejo de conhecimento e poder para conquista da independência – e da liberdade – será talvez uma forma de rebeldia. Atitude que poderá ser interpretada como uma espécie de insubordinação pela insistência em abdicar da protecção daqueles que são os guardiões do seu mundo perfeito e em romper o véu da imaculada cegueira branca, vivida num Éden que é um sistema fechado. Um mundo onde a felicidade assenta numa asséptica ignorância.
(continua aqui)